Parece haver um grande consenso de que em 2015 teremos de nos reposicionar como Governo, cidadãos e empreendedores. E os ajustes – para assegurar a travessia – serão bastante sensíveis do ponto de vista financeiro, concentrados na máxima do “gastar menos e melhor”, já que a economia parece não dar sinais de grande vitalidade.
E como esse cenário repercutirá no mercado bancário e, em particular, no cooperativismo financeiro?
Por conta das expectativas nada animadoras sobre nível da atividade econômica e do já elevado grau de comprometimento da renda dos brasileiros com o pagamento de dívidas há pouco contraídas, é improvável que o sistema financeiro convencional sinta-se à vontade para seguir emprestando com o apetite de outros tempos, especialmente para financiar o consumo. Isso inclui até mesmo os bancos oficiais, uma vez que o Tesouro já não tem o mesmo fôlego para bancar as necessidades de capital dessas instituições.
E tem mais: porquanto também se prognostica a descontinuidade dos reajustes reais nos salários (a prioridade será manter o emprego), combinada com novas demissões, notadamente na indústria, aumenta a preocupação com a inadimplência. Crescendo as impontualidades nos resgates das obrigações junto ao sistema financeiro, acentuam-se as provisões, o que, por sua vez, diminui a disponibilidade de capital para novos empréstimos.
Para o cooperativismo financeiro, sem que se despreze a cautela requerida em tais circunstâncias, o fato de a concorrência retrair-se no crédito gera uma grande oportunidade. Como as cooperativas conhecem melhor o seu associado do que o banco a seu cliente, devem aproveitar essa proximidade e antecipar-se aos concorrentes na busca do bom tomador. É inegável que a agilidade – para atender a uma necessidade, muitas vezes emergente, do associado – fará aumentar o sentimento de gratidão e de pertencimento do cooperado, além de impulsionar a migração de seus negócios complementares (mantidos, não raro, em instituição convencional) para dentro da cooperativa. Essa atmosfera, ademais, aponta para a possibilidade de atração de novos cooperados, diante de sua insatisfação como clientes de bancos…
Consulta a períodos recentes de semelhante adversidade ou incerteza, tanto no ambiente doméstico como externo (vide, por exemplo, 2008/2009), revela que as cooperativas deram saltos mais representativos em sua expansão justamente nesses momentos, afirmando, assim, um de seus grandes diferenciais, que é o compromisso permanente com o cooperado e a sua comunidade. Essa fidelidade, como já se disse, reproduz-se no comprometimento (fidelidade recíproca) do cooperado com a sua própria instituição financeira.
A conjuntura também sugere uma oferta mais intensiva do portfólio de produtos e serviços fora da intermediação financeira. Com efeito, a prudência adicional que se impõe em relação ao crédito (pelo alto risco envolvido) há de impulsionar a exploração das inúmeras alternativas de negócios já disponíveis – e ainda muito pouco ativadas – no meio cooperativo, como seguros, cartões, consórcios, previdência privada, cobrança, convênios e adquirência (de cartões), soluções essas de elevado potencial de rentabilidade e irrelevante consumo de capital (pelo risco irrisório). Neste particular, aliás, as cooperativas enfrentarão o apetite voraz dos bancos de varejo, que se tornarão ainda mais agressivos na busca de receitas novas para recompor a redução dos ganhos com o crédito.
Por fim, o cooperativismo deverá também “entrar no clima” que identifica – e desafia – os novos tempos da nação como um todo. Daí que, de um lado, rever seus modelos organizacionais de modo a, por exemplo, aproveitar adequadamente as estruturas de segundo e terceiro níveis sistêmicos (gastando menos e melhor), e avançar nos processos de aglutinações/incorporações (tanto para economizar como para ampliar os limites operacionais de forma a atender a demandas de crédito mais expressivas), e, de outro, repensar o padrão de seus investimentos, otimizando-os, serão movimentos cuja eficiência fortalecerá o setor e alavancará a sua presença no mercado financeiro.
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Ênio Meinen é advogado, pós-graduado em direito (FGV/RJ) e em gestão estratégica de pessoas (UFRGS) e autor/coautor de vários artigos e livros sobre cooperativismo financeiro – área na qual milita há 31 anos -, entre eles “Cooperativismo financeiro: percurso histórico, perspectivas e desafios”. Atualmente, é diretor de operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob).
Moro em brasília há 45 anos mas adoto alguns ensinamentos da minha educação mineira.
“Se tem poeira vá na frente, mas se tem barro, vá atrás”. Ao que nos parece, 2015 vai ser um ano de muita lama. -Como alerta, discretamente, o artigo do nosso Diretor Enio – Todo cuidado é pouco na hora de mudar a passada. A ordem é respeitar o tamanho das pernas.
Meu nome é Antonio Luiz da Silva e sou correntista da Credindústria.
Prezado Ênio, seus conselhos são muito adequados. É tempo de muita cautela, evitando os restolhos que os bancos já estão dispensando. Como você já salientou em artigos anteriores, não basta crescer o número de associados e a carteira de crédito. É preciso qualidade para que a cooperativa não fique comprometida com inadimplência.
Um abraço do amigo e admirador
Antonio Augusto