História do Cooperativismo » História do Cooperativismo de Crédito no Brasil

Conheça aqui alguns detalhes da História do Cooperativismo de Crédito no Brasil.

Um dos ramos mais dinâmicos do cooperativismo no passado, brutalmente esfacelado desde meados dos anos 60 e durante toda a década de 70, o cooperativismo de crédito busca novamente ocupar seu espaço, apesar de todas as dificuldades que lhe são impostas.

História do Cooperativismo de Crédito no Brasil1902 – Tudo começou em 1902, no Rio Grande do Sul, sob a inspiração do Padre Jesuíta Theodor Amstad que, conhecedor da experiência alemã do modelo de Friedrich Wilhelm Raiffeisen (1818-1888), para aqui a transplantou, com enorme sucesso. Foi criada em Linha Imperial, distrito de Nova Petrópolis/RS, a 1ª Cooperativa de Crédito da América Latina, a SICREDI Pioneira RS, atualmente uma das maiores do país e na época denominada “Caixa de Economia e Empréstimos Amstad“.

Esse modelo aplicava-se, preferencialmente, junto a pequenas comunidades rurais ou pequenas vilas. Fundamentava-se na honestidade de seus cooperados e atuava basicamente junto aos pequenos produtores rurais. Não dava importância ao capital dos cooperados.

Toda movimentação financeira era feita através de depósitos, que recebiam uma pequena remuneração. Admitia que qualquer pessoa nele depositasse suas economias. Com as sobras eventualmente apuradas, criava reservas para enfrentar, com mais segurança, momentos de incerteza.

Esse segmento do cooperativismo conseguiu um grande desenvolvimento no Rio Grande do Sul, desde sua implantação, chegando, inclusive, a dispor de uma cooperativa central com mais cinquenta cooperativas singulares a ela filiadas.

 

Outras datas importantes da História do Cooperativismo de Crédito no Brasil:

1903 – É promulgado o Decreto 979 de 06/01/1903 (link), que facultou, aos agricultores e profissionais das indústrias rurais, a organização de sindicatos com a finalidade de defesa de seus interesses. Em seu artigo 10, o referido Decreto permitiu aos sindicatos organizarem caixas rurais de crédito e de cooperativas de produção e consumo, deixando, contudo, em branco as normas de organização e funcionamento de tais institutos.

1907 – É publicado o decreto 1637 (link) de 05/01/1907 que dizia que as sociedades poderiam ser anônimas ou em nome coletivo. Eram características das cooperativas: a) variabilidade do capital social; b) a não limitação do numero de socios; c) a incessibilidade das ações, quotas ou partes a terceiros, estranhos à sociedade.

  • As sobras, depois de feita a destinação de 10% para o Fundo de Reserva deviam ser distribuídas em 2 partes iguais: uma proporcional ao capital e outra em partes iguais entre os sócios.
  • “Art. 23. As cooperativas de crédito agricola que se organizarem em pequenas circunscrições rurais, com ou sem capital social, sob a responsabilidade pessoal, solidaria e illimitada dos associados, para o fim de emprestar dinheiro aos sócios e receber em depósito suas economias, gozarão de isenção de selo para as operações e transacções de valor não excedente de 1:000$ e para os seus depositos.”

1920 – Tendo-se multiplicado fortemente por todo o país nas décadas seguintes, com apoio em legislação moderna e flexível, as cooperativas de crédito figuravam entre os principais agentes de financiamento da atividade rural, concedendo crédito farto, até mesmo para aquisição de terras. Em 08/09/1925, no RS, 18 cooperativas conceberam a primeira central brasileira do ramo, a “Central das Caixas Rurais da União Popular do Estado do Rio Grande do Sul, Sociedade Cooperativa de Responsabilidade Limitada“, anos mais tarde convertida em Cooperativa Singular, denominada atualmente SICREDI União Metropolitana RS.

1930 – No final dos anos 20 deste século, o modelo desenvolvido pelo italiano Luigi Luzzati (1841-1927) tomou força pelas mãos da Igreja Católica e por leigos que, participando de um Congresso Mariano em Roma, conheceram cooperativismo italiano.

Diferenciava-se do modelo alemão pelo fato de exigir um pequeno capital, quando da admissão de qualquer cooperado e ter como público preferencial os assalariados, os artesãos e os pequenos empresários, comerciantes ou industriais.

Mais adequado para as condições brasileiras do que o modelo alemão, o chamado cooperativismo de crédito popular por aqui se desenvolveu com uma velocidade espantosa.

Em 1932, o Decreto do Poder Legislativo nº 22.239 de 19/12/1932 (link), definiu que as Sociedades Cooperativas que seguiam o modelo de Raiffeisen deveriam observar as seguintes normas: ausência de capital social e indivisibilidade dos lucros; responsabilidade ilimitada; área de operações reduzida a uma pequena circunscrição rural, de preferência o distrito municipal, mas que não poderiam, em caso algum, exceder o território de um município. Os empréstimos deviam servir sempre para o fomento da produção rural, não podendo servir para incentivar o consumo.

  • Já as Sociedades cooperativas que seguiam o modelo Luzzatti deveriam observar: capital social dividido em quotas-parte de pequeno valor; responsabilidade limitada ao valor da quota-parte do capital; área de operações circunscrita, tanto quanto possível, ao território do município em que tiver a sua sede, só podendo estabelecer área maior, fora desse território, quando municípios próximos abrangessem zonas economicamente tributárias daquele em que estiver; administração constituída por um conselho de administração.

Este Decreto regulamentou a criação de Cooperativas Centrais e ainda criou 4 tipos de Cooperativas de Crédito Singulares:

  • Cooperativas de Crédito Agrícola (modelo Raiffeisen), que deveriam ter em seu quadro social no mínimo 60% de agricultores;
  • Cooperativas de Crédito Mútuo (modelo Desjardins), que exigia o vínculo entre os associados (profissão, empresa, ou classe);
  • Cooperativas Populares de Crédito Urbano (modelo Luzzatti), que permitiam a livre admissão de associados (qualquer ramo ou profissão);
  • Cooperativas de Crédito Profissionais, de Classe ou de Empresas, que não exigiam vinculo entre os associados, desde que tivessem características comuns entre si.

1940 – O tamanho êxito do movimento nas comunidades interioranas estimulou um grupo de bancários da capital gaúcha, a constituir em 1946 a “Cooperativa de Crédito dos Funcionários da Matriz do Banrisul Limitada“, a número um entre as entidades tipicamente urbanas, atualmente conhecida como Banricoop.

1943 – Está disponível no link um documento importante na época em que constavam todas as cooperativas registradas no Ministério da Agricultura. Trata-se do Boletim do Serviço de Economia Rural de 1943, publicado por meio da Portaria 160, de 19 de Outubro de 1943.

1950 – Entre as décadas de 30 e meados da década de 50, calcula-se que foram criadas cerca de 1.200 cooperativas do modelo Luzzatti e alcançaram um bom estágio de desenvolvimento. Seu único grande pecado foi não ter buscado a verticalização e não ter criado um antídoto para uns poucos aventureiros que, particularmente nos grandes centros, buscaram tirar proveito em benefício próprio.

Do ponto de vista das condições brasileiras, talvez continua sendo o modelo ideal para o nosso país.

Em 1951, a Lei 1.412 transforma a Caixa de Crédito Cooperativo (criada pelo Governo em 1943) no Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC), com objetivo de promover assistência e amparo às cooperativas. O BNCC possibilitava, com exclusividade, a participação indireta das cooperativas de crédito que captassem depósitos à vista na Câmara de Compensação de Cheques. O BNCC era controlado pela União, que inicialmente participava com 60% de seu capital, sendo os 40% restantes subscritos pelas cooperativas legalmente constituídas e em funcionamento. Não obstante a participação acionária, as cooperativas jamais tiveram qualquer ingerência na administração do banco, que nunca se constituiu em órgão de cúpula do sistema cooperativo.

1961 – Nesse ano, em 3 de agosto, foi constituída, por quatro cooperativas de crédito mútuo, a Feleme – Federação Leste Meridional de Cooperativas de Crédito, com sede no Rio de Janeiro, com o propósito de fomentar o cooperativismo de crédito mútuo, atuando em quatro estados. A Feleme, com o apoio da CUNA – Credit Union National Association, entidade de 3º grau das cooperativas de crédito mútuo dos Estados Unidos, foi a grande mola propulsora do desenvolvimento do cooperativismo de crédito mútuo no Brasil.

 

A década de 1960 trouxe grande dificuldade para a História do Cooperativismo de Crédito no Brasil:

1962 – Nos anos que ficaram conhecidos como sendo da ditadura militar brasileira, foram retiradas das Cooperativas parte das suas condições de funcionamento. As mesmas foram impedidas de captar recursos em depósitos à prazo (aplicações) e seus empréstimos tinham taxas de juros controladas. O depósito à vista não foi proibido, mas como as cooperativas não tinham cheque compensável não havia incentivo para o associado deixar seus recursos parados a juro zero. O crédito rural podia ter como taxa máxima 13% ao ano devendo 80% da carteira de crédito ser alocada neste segmento e o crédito geral podia ser emprestado a 24% ao ano podendo emprestar os 20% restantes. Estas taxas de juros limitadas tinham como agravante a inflação da época que em 1964, por exemplo, foi de 91,8% ao ano que após a ação do governo reduziu para 22% em 1968.

  • Segundo o Banco Central do Brasil, “ao fim de 1961, existiam no Brasil 511 cooperativas de crédito, com 547.854 associados.
  • O Decreto do Conselho de Ministros nº 1.503, de 12 de novembro de 1962 (link), sobrestou as autorizações e os registros de novas cooperativas de crédito ou com seções de crédito. Após essa data, verificou-se um declínio no número de instituições, que somente seria revertido cerca de vinte anos depois.”
  • Em 1964, a Lei nº 4.595 (link) equipara as cooperativas de crédito às demais instituições financeiras e transfere ao Banco Central do Brasil as atribuições cometidas por lei ao Ministério da Agricultura, no que concerne à autorização de funcionamento e fiscalização de cooperativas de crédito de qualquer tipo e da seção de crédito das cooperativas que a tenham. A Lei prevê também que podem existir apenas 2 tipos de cooperativas de crédito: as de crédito rural e as de crédito mútuo, formadas por empregados de uma mesma empresa, inibindo a criação de novas cooperativas do tipo Luzatti.
  • Em 1965, a Resolução nº 11 do Conselho Monetário Nacional (CMN) (link) determina a extinção das atividades creditórias exercidas por sucursais, agências, filiais, departamentos, escritórios ou qualquer outra espécie de dependência existente em cooperativa de crédito. Veda às cooperativas de crédito o uso da palavra “banco” em sua denominação. Torna a autorizar a constituição e o funcionamento de cooperativas de crédito, sob duas modalidades: a) cooperativas de crédito de produção rural com objetivo de operar em crédito; b) cooperativas de crédito com quadro social formado unicamente por empregados de determinada empresa ou entidade pública ou privada.
  • Em 1966, a Resolução nº 15 (link) estabelece que as cooperativas de crédito e as seções de crédito das cooperativas mistas somente podem captar depósitos à vista de seus associados. Estabelece, ainda, que é vedado deixar de distribuir eventuais sobras apuradas entre os associados.

1971 – Sancionada a Lei 5.764/71 (link) instituindo o regime jurídico vigente das sociedades cooperativas. Define a cooperativa como sociedade de pessoas, de natureza civil. Mantém a fiscalização e o controle das cooperativas de crédito e das seções de crédito das agrícolas mistas com o Banco Central do Brasil.

 

Uma nova página na História do Cooperativismo de Crédito no Brasil

1980 – Um pulo sobre o setembro negro do cooperativismo de crédito brasileiro, que compreende a segunda metade dos anos 60 até o início dos anos 90, testemunha a busca de recriação das cooperativas de crédito rural.

  • Em 1980 remanesciam em todo o Brasil apenas 430 cooperativas de crédito.

Analisada a experiência do passado, e ciente de que o meio rural não teria condições de arcar com as altas taxas de juros que são cobradas pelas instituições bancárias, um cooperativista brasileiro chamado Mário Kruel Guimarães deu início a um processo de objetivos muito bem definidos, na tentativa de criar um verdadeiro Sistema de Crédito Rural cooperativo no país. Esse projeto começou a ser deslanchado no ano de 1981 e teve muito boa aceitação no Rio Grande do Sul, sendo constituída a “Cooperativa Central de Crédito Rural do Rio Grande do Sul Ltda – COCECRER“, a primeira dos novos tempos (nova era da História do Cooperativismo de Crédito no Brasil).

  • Das 14 cooperativas de crédito remanescentes no Rio Grande do Sul, 9 delas recriaram a Central Cocecrer. Até estarem concluídos seus atos constitutivos, outras 30 cooperativas singulares já estavam prontas para começarem a funcionar, grande parte delas criadas dentro de Cooperativas Agropecuárias. (leia a matéria a respeito)

1984 – Os Estados do Paraná e de Santa Catarina começaram a desenvolver esse segmento em 1984. Os Estados de Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo, Bahia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás no ano seguinte também começaram a implantar cooperativas de crédito rural. Foi um reinício na História do Cooperativismo de Crédito no Brasil.

  • Após o processo reflexivo de análise do seu comportamento no passado, o cooperativismo de crédito rural renasceu em bases seguras e com uma proposta firme que o possibilita identificar, ainda no nascedouro, qualquer desvio que possa prejudicá-lo no seu desenvolvimento.
  • Esse fato tem permitido, ao longo da década e, apesar dos percalços vividos pela economia brasileira no mesmo período, um nível de desenvolvimento sem precedentes, apesar da enorme dificuldade que tem encontrado.
  • Dificuldade essa que pode ser traduzida pela negação que lhe é dada em obter os mesmos instrumentos que são oferecidos ao sistema financeiro concorrente.

Em 1986 é constituída, em Vitória/ES, a primeira confederação do setor, a “Confederação Brasileira das Cooperativas de Crédito – Confebras“, como sucessora da Feleme, e com interesse pelo fomento mais abrangente das cooperativas de crédito urbano.

Em 1989, no município gaúcho de Casca/RS, surge a primeira cooperativa de médicos e demais profissionais da saúde, denominada “Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo dos Profissionais da Saúde Vinculados à Unimed Vale das Antas Ltda. – UNICRED Vale das Antas“, cujo exemplo, em rápida sequencia, serviria para o acelerado e salutar alastramento de entidades co-irmãs por todo o país.

1988 – A Constituição Federal de 1988 (link), em seu artigo 192 incluiu as Cooperativas de Crédito no Sistema Financeiro Nacional, dando um novo horizonte ao futuro das mesmas.

1990 – Em meio ao Plano Collor, no dia 21 de Março de 1990 é extinto o BNCC, Banco Nacional de Crédito Cooperativo. Do dia para a noite as Cooperativas de Crédito deixam de ter cheque compensado, forçando que as mesmas façam convênios com outras instituições financeiras, principalmente o Banco do Brasil.

1994 – A Resolução 2099/04 (link) volta a permitir a abertura de Unidades de Atendimento (PAC´s). Desde 1965 as Cooperativas podiam prestar atendimento apenas em suas sedes.

1995 – A Resolução nº 2.193/95 (link) permite a constituição de bancos comerciais controlados por cooperativas de crédito, os bancos cooperativos. Surgem em seguida o Banco Sicredi S.A. e o Banco Sicoob S/A. No ano de 2000 é autorizada através da Resolução nº 2.788 a constituição de bancos múltiplos cooperativos.

 

Etapas recentes na história recente

2003 – A Resolução 3.106/03 do CMN (link) permite a criação de Cooperativas de Crédito de Livre Admissão de Associados ampliando as possibilidades de crescimento da participação de mercado das cooperativas visto que até então existiam basicamente cooperativas de crédito rural e cooperativas de crédito mútuo (que exigem um vínculo entre os associados).

2009 – É sancionada a Lei Complementar 130/2009 (link) que reconhece para as Cooperativas de Crédito direitos que já haviam sido reconhecidos através de Resoluções do Banco Central.

2012 – A Resolução 4.150/12 do CMN criou a obrigatoriedade das cooperativas de crédito contribuirem para seu próprio Fundo Garantidor, o FGCoop, o Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito. As primeiras contribuições para o fundo o fundo ocorreram em abril/2014.

2012 – Através da Resolução 4.151/12 o CMN admitiu a possibilidade dos sistemas cooperativos publicarem um Balancete Combinado, elaborado com base em informações financeiras das instituições integrantes do sistema cooperativo ao qual se refere, como se esse sistema representasse uma única entidade econômica.

2022 – Atualização da LC 130/09, a partir da aprovação da Lei Complementar 196/22. A tramitação da lei foi em tempo recorde, com cerca de 2 anos, demonstrando o apoio do Banco Central do Brasil e do parlamento na construção de novos marcos da História do Cooperativismo de Crédito no Brasil.

Fonte: Portal do Cooperativismo

4 Comentários

  1. Fantástico!
    Adoro saber a história das coisas, pois é ela que explica quem somos o porque estamos aqui!

    Bom saber também, que, embora mais devagar do que gostaríamos, as instituições de interesse social vêm se recompondo e derrubando barreiras criadas pelo(s) regime(s) ditatorial(is) e do atraso social…

  2. Prezados, gostei muito do artigo escrito por vocês.

    Pretendo fazer citação direta/indireta em um projeto acadêmico do curso que faço.
    Para isso, preciso saber o nome do autor do artigo e data da publicação.

    Grato

  3. Bom dia!
    Gostaria de ter acesso ao livro (e-book) COOPERATIVISMO FINANCEIRO constante nesta página. Entretanto, no local onde informa para fazer download, não há nenhuma forma para isso.

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