“Somos pássaros de uma mesma pena. Portanto, temos de voar juntos” (homenagem a Roberto Gurgel, Procurador-geral da República, inspirador desta máxima).
Há poucos dias, resultado de longas tratativas envolvendo o Banco Central do Brasil e a representação do cooperativismo de crédito, foi publicada a Resolução de nº 4.150, do Conselho Monetário Nacional, que fixa as diretrizes para a criação do fundo garantidor do qual devem participar todas as cooperativas de crédito que operam depósitos, bem como seus bancos cooperativos.
De um lado, as reservas assegurarão créditos (depósitos, em especial, e outros vierem a ser definidos pelo próprio movimento cooperativo) de titularidade dos associados e clientes nos casos de (incogitável) interrupção das atividades de cooperativa ou banco associado e, de outro, em caráter preventivo, permitirão assistência ou suporte financeiros a essas mesmas entidades para impedir que fechem as suas portas.
Evidentemente que é de todo desejável que nenhum dos participantes chegue ao ponto de descontinuar o funcionamento, razão pela qual a atuação preventiva do fundo – como mecanismo de solidez – mostra-se muito mais razoável e aconselhável, servindo para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro e os limites técnicos das entidades assistidas, além de facilitar processos de incorporação por coirmãs. Por essa razão, é de se supor que, logo mais, seja este o principal objetivo do FGCoop, aos moldes do que, por exemplo, se pratica no pujante e sólido cooperativismo de crédito alemão, onde há 70 anos não se conhece um único caso de liquidação de cooperativa. Nessa (futura) ocasião, o setor poderá também reavaliar a conveniência e a oportunidade da sobremanutenção dos atuais fundos intrassistêmicos. Até lá as reservas hoje individualmente existentes, além de cumprirem eventuais outras funções, poderão exercer papel importante no processo de revitalização de cooperativas em dificuldade e incentivar as indispensáveis aglutinações.
O fundo intersistêmico, alimentado por contribuições das próprias cooperativas e recursos representados pela taxa de serviço (já recolhida e a recolher) cobrada por inclusões e exclusões no/do CCF – cadastro de emitentes de cheques sem fundos (“Recheque”), ficará alocado em entidade segregada dos participantes, de fins não lucrativos, devendo contar com governança própria e políticas pré-aprovadas de aplicação dos recursos (no mercado) e sua utilização (junto às entidades e associados/clientes). Ainda falta assegurar, por ato legislativo, a isonomia tributária com o fundo garantidor das instituições financeiras convencionais (FGC), de modo que as rendas da aplicação de suas disponibilidades também não se submetam à tributação.
A iniciativa, além dos efeitos benéficos internos, causará boa impressão junto à sociedade, vez que projetará maior solidez, evidenciará a efetiva grandeza e aumentará a credibilidade do movimento diante do público em geral.
Mesmos que esses predicativos já sejam de conhecimento de todos aqueles que vivenciam o dia a dia das cooperativas, a instituição do FGCoop contribuirá para que o cooperativismo de crédito seja percebido, especialmente de fora e entre os associados, em unidade e não mais em fragmentos microssistêmicos, elevando a sua competitividade e assim equilibrando forças com o mercado.
E é nesse fundamento – convergência entre todas as entidades e todos os blocos – que reside o maior dos méritos do fundo intersistêmico. Disse muito bem o ministro-presidente do Banco Central do Brasil, Alexandre Tombini, ao anunciar o lançamento por ocasião da abertura do IV Fórum Banco Central sobre Inclusão Financeira, no dia 29-10-12, em Porto Alegre – RS, que o FGCoop representaria movimento crucial para a criação do sistema nacional de crédito cooperativo, pavimentando o caminho para a unidade do cooperativismo de crédito brasileiro.
A intercooperação sob o FGCoop será, mesmo, inevitável, e há que se aproveitar a oportunidade. Os representantes do setor terão um canal oficial para dialogar sobre a situação econômico-financeira das entidades associadas; eleger modelos de risco e formas de avaliação; definir as condições de acompanhamento das entidades, inclusive com relação aos serviços de auditoria independente (que se recomenda sejam especializados no segmento cooperativo, âmbito no qual a CNAC se destaca); fixar critérios de contribuição; falar sobre estratégias para evitar o insucesso das associadas (pois todos serão prejudicados em caso de adversidades extremas), entre outras matérias relevantes. Em síntese, a nova entidade constituir-se-á em fórum ideal para construir um abrangente “acordo de convivência” sobre temas de interesse comum.
Não há dúvida de que daí emergirão ações concretas que permitirão rever e aprimorar os atuais formatos organizacionais, ainda bastante fragmentados e repetidos por grupos isolados de entidades, de modo que, sem muita demora, atividades comuns, especialmente de retaguarda administrativa e operacional e de apoio ao negócio (naquilo que em que um CNPJ único nem será sentido na ponta…), possam ser agrupadas ou compostas de forma mais racional, sem paralelismos entre os microssistemas, promovendo-se considerável economia de escopo no interesse do conjunto dos associados. E isso é particularmente importante em um cenário (chamado realidade…) em que todos à volta almejam ser mais eficientes (pela redução de custos improdutivos/desnecessários) e buscam os benefícios do ganho de escala.
Aliás, como esforço de aproximação entre os diferentes grupamentos de cooperativas, incluindo aí as não integradas verticalmente, e com a ideia de otimização dos recursos e fortalecimento do setor, o FGCoop põe-se ao lado da CNAC – Confederação Nacional de Auditoria Cooperativa, cuja concepção visa ao aprimoramento do processo de supervisão do cooperativismo de crédito como um todo. A consolidação da entidade, no entanto, à luz dos debates e encaminhamentos em curso, reivindica ampliação do escopo de atuação de forma a atrair atividades correlacionadas (auditoria interna/supervisão auxiliar, por exemplo), hoje multirrepetidas sob dezenas de CNPJs (estruturas), providência essa que resultará em considerável redução de custos com tais serviços, além de aprimorá-los em seu conjunto.
Enfim, com o FGCoop os donos do negócio – 6 milhões de cooperados –, por seus representantes, têm a partir de agora um incentivo a mais para dar vida ao mais relevante dispositivo da Lei Complementar 130, representado pelo seu preâmbulo, que prevê a criação do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo!
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Ênio Meinen é associado de cooperativa de crédito; atua há 30 anos em atividades jurídicas e de gestão no setor, respondendo atualmente pela diretoria de operações do Banco Cooperativo do Brasil – Bancoob.
Das destinações das sobras, a quantia que fica no fundo de reserva pela lei é 10%, se não estou enganado, no Sicredi é 45%, de quanto é no Sicoob? Unicredi? cresol?