Se por um acaso a Cooperativa que você faz parte hoje, não pudesse usufruir mais de algum benefício ou incentivo fiscal, ela sobreviveria no mercado? Caso você nunca tenha parado para pensar sobre esta não remota possibilidade, te convido para uma breve reflexão sobre o tema.
Profissionais que atuam nos mais diversos setores do cooperativismo, mais especificamente distribuídos em 13 ramos de atividades, conforme definição da Organização das Cooperativas Brasileiras – OCB, sabem que tais sociedades em muitos casos, possuem inúmeros benefícios e incentivos fiscais amparados normativos legais. Tal fato, deve-se principalmente a doutrina histórica do cooperativismo, tendo como base o livre associativismo, que por sua vez, congrega inúmeras pessoas com objetivos comuns, para satisfazer seus anseios e objetivos profissionais, não visando maximizar resultados na pessoa jurídica e sim, gerar e distribuir renda, segundo critérios de proporcionalidade, a todos que fazem parte da sociedade.
São notórios e incontestáveis os benefícios que uma cooperativa gera para determinada região onde atua, melhor distribuição de renda, geração de empregos diretos e indiretos, melhor ganho de escala, assistência aos cooperados, educação e formação, entre outros.
Por serem instituições tão promissoras e benéficas para a sociedade, muitos são os apoios e incentivos que recebem por parte das esferas governamentais, para que se fortaleçam cada vez mais e ganhem ainda mais competitividade no mercado. Todavia, em momentos de retração econômica, assim como o Brasil ainda vive nos dias de hoje, com PIB negativo, alta taxa de juros, elevado nível de desemprego, déficit primário de bilhões que aumenta a dívida pública e, como consequência disso, necessidade eminente de aumento de arrecadação, há grande probabilidade que alguns setores da economia, tenham que desembolsar caixa para pagar esta conta, seja por meio da criação de novos impostos ou até mesmo, pela suspensão de benefícios e inventivos de caráter provisórios ou permanentes.
Alíquotas zero, créditos presumidos, diferimentos, não incidência, redução e exclusão em bases de cálculo são algumas terminologias muito prováveis de serem encontradas, quando pesquisamos em legislações tributárias específicas e aplicáveis às sociedades cooperativas. Vejamos o caso de uma Cooperativa de Consumo COOP, antiga Cooperhodia, considerada uma das maiores redes de supermercados do país.
Na década de 60, a legislação tributária sofreu uma importante reforma que, conforme ANDRÉ VILLELA (2005, p. 57), esta fora necessária além de diversos outros fatores, para estancar o déficit público decorrente da expansão monetária. Observem que após cinco décadas, ainda convivemos no Brasil com problemas muito semelhantes, se não, iguais aos do passado. Com a reforma tributária de 1966, a COOP, já constituída e atuante no mercado fora surpreendida conforme matéria extraída da revista Época Negócios (Ed. Julho 2013):
“… O primeiro grande obstáculo foi a mudança na legislação tributária na década de 60. O IVC, Imposto sobre Vendas e Consignação (do qual a cooperativa era isenta) foi transformado no ICM, o Imposto sobre circulação de Mercadorias, e estendido para empreendimentos como a COOP. Só essa nova regra fez o número de cooperativas de consumo cair de 2.420 para 300, nos fim dos anos 60.” [grifo nosso]
Gostaria de chamar atenção em relação a este primeiro obstáculo que, conforme apresentado na reportagem, ocorreu há 50 anos e, é fácil entender que não seria simples analisar tal risco pois, na época havia maior nível de instabilidade sobre diversos aspectos, principalmente econômicos, além da falta de ferramentas e conhecimentos específicos para os profissionais que atuavam na gestão do negócio. E hoje? Com todo o acesso e maiores facilidades que temos para obter informações, com todos subsídios e ferramentas que possuímos para suporte à tomada de decisão, sofisticados sistemas de gestão, paramos para refletir sobre este risco para o setor que estamos inseridos?
Não precisamos ir tão distante no tempo, pensemos em datas mais recentes como no último ano de 2016. O setor de Cooperativas de Transporte do Estado do Espírito Santo foi surpreendido com a publicação do Decreto 3.963-R, de 15 de Abril de 2016 que, revogou o crédito presumido de 20% sobre os débitos gerados de ICMS das empresas e cooperativas de transportes de cargas (Art. 107, III do RICMS/ES), com efeitos já para o mês de Maio do mesmo ano.
Ou seja, se determinada cooperativa faturasse R$ 1.000.000,00 no mês, a partir do mês seguinte, não contaria mais com 20% sobre o valor do imposto a ser recolhido, para abatimento na apuração final do ICMS e, recolheria os 12% sobre o total faturado no mês, considerando ainda que as cooperativas não podem operar no regime ordinário de apuração pois, no ES, de acordo com o Art. 99 do RICMS/ES, somente veículos próprios da PJ podem utilizar créditos de ICMS das entradas. Neste exemplo, o impacto seria um acréscimo de R$ 24.000,00 por mês sobre a apuração final do ICMS/ES.
Um outro ponto que deixa latente o risco de muitas Cooperativas não contarem mais com algum benefício ou incentivo é que, desde Maio de 2016, por meio do Convênio ICMS 42 do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, autorizou todos os Estados da federação a reduzirem em no mínimo 10%, os à incentivos e benefícios fiscais, financeiros ou não, inclusive os decorrentes de regimes especiais de apuração. Observem que todas essas ações são realizadas em épocas de ajuste fiscal. Cabe a nós, profissionais da área, estarmos atentos e estudarmos os impactos que a ausência dos benefícios fiscais podem trazer para nosso negócio.
Diante do exposto já ocorrido, ainda precisamos olhar pra frente para destacar futuras ações e reformas que tramitam em âmbito federal e, impactarão no resultado das cooperativas, dentre elas, podemos destacar a Reforma Previdenciária, que trará reflexo principalmente sobre o produtor rural pois, de acordo com a proposta inicialmente apresentada, o sistema de financiamento da aposentadoria do trabalhador rural deixa de ser custeada mediante contribuição sobre a produção comercializada, rateada entre os membros do grupo familiar, e passa a ser individual e calculada sobre o salário mínimo, em percentual a ser fixado em lei.
Reforma Tributária, que visa a desburocratização tributária e, em vista da possível unificação de vários impostos e contribuições, utilizando-se o Congresso Nacional da linha de pensamento de “Unificar para Dividir”, já fora falado em um possível IVA – Imposto sobre Valor Acrescentado que, unificaria impostos Federais, Estaduais e Municipais. Porém, em virtude da grande diferença econômica entre os Estados da Federação, essas unificações poderão ser prejudiciais ao federalismo, por isso, o assunto ainda é alvo de estudos.
O Projeto de Lei Complementar do Senado Federal 54/2015, que somente valida benefícios fiscais concedidos pelos Estados, sem anuência do CONFAZ, mediante votos favoráveis de, no mínimo, dois terços das unidades federadas e de um terço de cada uma das 5 regiões do país, ou seja, caso tal projeto seja aprovado muitos benefícios seriam considerados inconstitucionais pois, diversos Estados ainda oferecem muitos benefícios sem a anuência do CONFAZ.
Em vista dos fatos apresentados neste breve artigo, deixo aqui uma sugestão para os profissionais que estão a frente destas instituições, para que analisem este eminente risco fiscal e tenham tempo hábil para sugerir mudanças em suas estratégias operacionais, principalmente junto ao quadro social pois, segundo as teorias do evolucionismo: “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”.