Nestes últimos anos tenho defendido exaustivamente para os meus clientes, em livros, em palestras ou em meus planejamentos de marcas, que nada tem sido tão forte e tão decisivo para ampliar e consolidar o valor de uma marca quanto a coerência na gestão dos sinais dessa própria marca.
Eu falo da coerência de significado nos sinais da organização: o resultado líquido entre o que a empresa fala e como ela age. Entre o que ela diz oficialmente e suas práticas. Das grandes mensagens bem pensadas pela diretoria àqueles pequenos sinais, corriqueiros, do dia-a-dia da organização, que a gente acredita que não têm valor, mas que impactam, geram significados e criam percepções.
Eu falo não só das manifestações planejadas oficialmente, mas também de todas aquelas outras, não autorizadas – que ninguém sabe como, brotaram sem controle e, que hoje se espalham como erva daninha na organização. De absolutamente tudo que exala significado e que torna perceptível a imagem e a personalidade de uma organização. Dos releases, das opiniões de influenciadores pagos às percepções que o portfólio sozinho evoca, sem ninguém defender nada.
Da coerência entre a promessa de valor na comunicação e o preço praticado, com seus descontos, promoções, restrições e asteriscos escondidos. Tudo fala. Do que os patrocínios falam, do que as intervenções falam e as ações falam. Da coerência entre o que se determina nas convenções e encontros e o que se vê depois, no chão da fábrica ou na experiência com o consumidor.
Na coerência entre o que se fala na propaganda e o que se realmente vende. Na coerência entre a ética, os princípios e os valores emoldurados bonitos num quadro na recepção e como essa mesma organização trata seus clientes, fornecedores, colaboradores e parceiros, na hora da verdade de cada momento do negócio. Coerência entre o que se planeja e o que se executa. Coerência entre o que se decide na sala do presidente e como isso é conduzido nas conversas de corredor frente aos interesses de cada gestor.
São sinais da organização que vão criando e consolidando percepções em torno de coerência ou de incoerência. Embates velados, tensões e arranjos que, aos poucos, definem o tecido cultural da empresa. Sinais que acabam determinando significado e transformando o intangível da cultura em algo concreto, palpável, perceptível a todos.
E, você sabe que os mesmos fatos repetidos muitas vezes acabam virando modo de vida das pessoas. E esse modo de agir vira caráter da empresa. E caráter, na maioria das vezes, determina o destino das organizações.
Ou seja, quanto mais a empresa vive suas verdades e pratica seus valores de forma genuína, mais coerente se torna a marca perante os seus públicos e mais confiança se gera na relação. Quanto mais incoerente, mais frágil e falso tudo fica.
Porque as marcas das organizações, em essência, se assemelham muito às nossas facetas humanas. Afinal, criamos empresas – que são organismos vivos, à nossa imagem e semelhança. E para nós, seres humanos, incoerência de valores e falhas de caráter sempre foram associados com fragilidade de personalidade e desvio moral. E se tem alguma coisa que consegue minar rapidamente um relacionamento é isso.
Assim, eu diria que os propósitos nas organizações assumem uma missão vital para o destino delas mesmas: permitir que as empresas mergulhem nas suas próprias entranhas e que assim, redescubram a si mesmas, tendo a chance de se perguntar novamente sobre o seu “por quê?” Por que fazemos o que fazemos? O que nos move? Qual é o significado desse empreendimento? Pelo que vale a pena insistir e continuar? Pelo que vale a pena levantar da cama pelo resto da vida?
Por que isso é importante?
Primeiro porque uma cultura organizacional forte é a união de pessoas que acreditam na mesma coisa que a empresa acredita e defende. E isso pode ser uma força poderosa para uma organização: colocar todos com o mesmo foco, com os mesmos objetivos, defendendo as mesmas coisas. Isso faz com que as pessoas possam parar de perder tempo em tentar provar umas às outras quem está com a razão na escolha do melhor caminho e permitir que todos se concentrem no que é realmente estratégico fazer.
Só isso já seria um enorme valor.
E segundo, porque eu acredito que, numa sociedade ruidosa e congestionada como a nossa, cada vez mais os consumidores vão definir suas escolhas: de bancos, carros, tecnologia, moda, à farmácias e supermercados não mais pelo preço, nem pelo design, nem pela tecnologia, nem pelos canais, mas principalmente pelo significado dessas marcas na sociedade e acima de tudo pela coerência em como vivem esse significado.
E assim, lembre-se que o branding pode resistir a alguns pequenos desvios de rota, pode resistir aos profissionais de marketing despreparados, à algumas campanhas de comunicação equivocadas e pode até suportar alguma dose eventual de comunicação medíocre, (faz parte da vida) mas as marcas geralmente não suportam por muito tempo a incoerência. Isso sim, pode ser fatal. Mesmo para grandes marcas.