Como o cooperativismo faz o ciclo econômico acontecer?, com Ênio Meinen

O Brasil vem enfrentando muitas situações complicadas nos últimos tempos e isso se intensifica ainda mais quando falamos do sistema econômico do país. Para conseguir uma excelente recuperação, é necessário que estratégias sejam planejadas e colocadas em prática o mais rápido possível.

Quando falamos sobre economia, automaticamente pensamos em modelos representativos, inclusive, o cooperativismo. O movimento vem ganhando, cada vez mais, o reconhecimento como um modelo econômico do futuro, que permanece vivo em meio as crises e visa a geração de lucro sempre com um retorno positivo para a sociedade. Porém, como o setor faz o ciclo econômico acontecer?

Para saber mais sobre o assunto, conversamos, com exclusividade, com o Diretor de Operações no Banco Cooperativo do Brasil S/A – Bancoob, Ênio Meinen, que possui 35 anos de experiência no cooperativismo financeiro.

Confira!

O cooperativismo pode ser considerado o modelo econômico do futuro? Se sim, por quê?

Não tenho dúvida. O fato de a inciativa cooperativa agregar compromisso social ao objetivo econômico, coloca o movimento na vanguarda do novo empreendedorismo. A sociedade está em busca de soluções mais conscientes, justas, inclusivas, que promovam valor também para o entorno (além do simples lucro para o acionista) e sobre as quais possa exercer efetivo protagonismo, características essas que são inerentes ao modelo cooperativo.

Por sinal, cresce o número de pensadores e influenciadores contemporâneos que vêm exaltando os méritos cooperativos. Entre eles, Robert Shiller, Nobel de Economia em 2013, talvez tenha feito a melhora leitura sobre o potencial transformador do cooperativismo, ao afirmar que “o movimento cooperativo constitui uma inovação essencial para uma boa e nova sociedade. É, portanto, uma iniciativa sempre atual para esse propósito, uma vez que, embora reconheça a livre iniciativa, não tem o lucro como objetivo … Cooperativismo é sinônimo de boa sociedade”. (Quebec, Canadá, 7 de outubro de 2014, durante a Segunda Cúpula Mundial do Cooperativismo)

Atualmente, como o cooperativismo contribui para a economia do Brasil e para o desenvolvimento socioeconômico das comunidades brasileiras?

A sociedade cooperativa, como instituição de forte vínculo territorial, reúne singular vocação para o desenvolvimento local e regional. Nesse sentido, em todas as suas formas de manifestação, tem produzido impactos positivos relevantes em várias regiões do país, com ênfase às regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste. Nas regiões Nordeste e Norte a sua atuação, aos poucos, também começa a ser percebida.

O cooperativismo financeiro, particularmente, tem sido um dos destaques do ecossistema cooperativista na promoção da justiça financeira e da prosperidade por todo o país. As cooperativas do ramo, por exemplo, são a únicas a estarem presentes (no conceito de agências completas) em mais de 10% dos municípios brasileiros. Sem elas, as pessoas e empreendedores dessas comunidades remotas não teriam acesso a crédito e outros serviços financeiros básicos, tendo que buscar tais soluções, com altos dispêndios, em outras localidades, para onde também seria drenada a renda e a riqueza.

Em termos de participação de mercado, vale acentuar que hoje 10% do crédito tomado pelo pequeno negócio já provém das cooperativas, que também fornecem aproximadamente 20% de todo crédito não consignado no país. Fazendo recortes regionais, há casos em que as cooperativas respondem por mais de 50% do crédito em tais situações, como são os casos de Rondônia e Santa Catarina, respectivamente.

No campo, especificamente, da justiça financeira, a melhor notícia é o fato de o sistema financeiro cooperativo ter propiciado uma economia da ordem de R$ 20 bilhões de reais para os seus cooperados em 2018, número esse decorrente da diferença de precificação na comparação com as práticas do mercado financeiro convencional.

Qual a diferença entre economia compartilhada, colaborativa e circular? Onde o cooperativismo se encaixa?

Vejo como convergentes as iniciativas classificadas como economia compartilhada, colaborativa, de rede/circular, ou ainda capitalismo consciente ou nova economia.

O cooperativismo, por sua vez, é precursor, desde o seu nascedouro – há 175 anos –, de todos esses movimentos. Além disso, responsabilidade socioambiental; descentralização; desintermediação; protagonismo do usuário; horizontalização; user centric; customer experience; employee experience etc., muito citados como novidades no ambiente corporativo, não são nada originais para o mundo da cooperação.

Como você enxerga o futuro econômico do Brasil? O cooperativismo já pode ser visto como uma tendência?

Há muitos desafios para uma dinâmica mais acentuada, previsível e estável da economia brasileira. A notícia boa é que ações estruturais já estão em curso. A reforma do sistema de previdência haverá de ser sucedida por outras, como é o caso da tributária, que deverá ser acompanhada de uma revisitação do (hoje acanhado) regime de privatizações e do formato das regras para investimentos público-privados no campo da infraestrutura. Essas serão as credenciais para o Brasil ser destinatário, não especulativo, de uma fatia mais expressiva da elevada liquidez financeira ao redor do mundo.

Quanto ao cooperativismo, já não é mera promessa, mas uma realidade. Representatividade como 48% do PIB agropecuário, 50% das cargas transportadas pelo país, 30% dos planos médico-odontológicos e 15% do crédito para a atividade rural, são algumas das evidências nesse sentido. Como tendência, dadas as suas virtudes e o fato de a presença real ainda estar bastante aquém da potencial, é inexorável a ampliação do protagonismo cooperativista.

O que faz o cooperativismo sobreviver em meio às mudanças e crises econômicas que a sociedade enfrenta no decorrer dos anos?

A história recente mostra que empreendedorismo cooperativo é bastante resiliente, e, além disso, tem sido responsável por uma decisiva atuação anticíclica ao servir de ponte para a travessia de pessoas físicas e empreendedores em tempos adversos.

Quando a retração econômica ou a instabilidade institucional se instalam, os agentes econômicos convencionais recolhem-se. Enquanto isso, considerando que entre a cooperativa e seus membros há uma afeição e um compromisso societário mais intensos, os cooperados continuam sendo assistidos normalmente. No fim, até mesmo em razão da empatia social que se estabelece, o resultado é o fortalecimento da atividade cooperativa, seja pela fidelidade operacional dos cooperados existentes, seja pela atração de novos sócios. E é justamente por isso que na crise o cooperativismo tem experimentado os maiores índices de expansão.

Fonte: mundocoop.com.br

2 Comentários

  1. Ótimo material, abre horizontes sobre o potencial que temos com o cooperativismo. Ainda hoje farei leitura de materiais do economista citado. Parabéns pelo texto.

  2. Concordo com você Ênio, tenho certeza que atuando na base da sociedade ela mesma vai resolver seus problemas deixando de esperar que soluções miraculosas venham de cima.

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