O gigante francês, Banco Cooperativo Crédit Agricole S/A, o 5º maior banco do mundo, alertou que enfrenta mais de US$ 1 bilhão em novos prejuízos em suas problemáticas operações gregas, num sinal de que a crise financeira europeia ameaça contaminar até os países relativamente saudáveis da região. Como outros bancos franceses, o Crédit Agricole se aventurou no sul da Europa nos últimos anos, atraído pelo crescimento rápido da região quando a zona do euro se expandia para a periferia do continente. Mas essas apostas fizeram água e os problemas do banco de 116 anos se tornaram simbólicos da crise que também assola outros bancos europeus.
Os problemas são especialmente graves nos bancos franceses. O Crédit Agricole tem uma subsidiária grega que está sob pressão e também detém participação em bancos espanhóis e portugueses. O Société Générale SA tem um banco grego que está no vermelho. Outro importante banco francês, o BNP Paribas SA, controla um banco português e tem bilhões de euros em dívidas gregas e espanholas, que muitos especialistas consideram em risco de moratória.
O Crédit Agricole divulgou ontem que pode ter que provisionar € 450 milhões (US$ 554,3 milhões) para cobrir créditos de recebimento duvidoso na Grécia, e deve ter de contabilizar uma baixa de € 400 milhões no segundo trimestre referente à depreciação de sua combalida subsidiária Emporiki Bank of Greece SA. Esses prejuízos, somados a cerca de € 2,6 bilhões em perdas no próprio Emporiki, não põem em risco o Crédit Agricole, mas analistas dizem que podem dar uma boa mordida nos lucros de 2010 do banco.
A investida do Crédit Agricole fora da França “tem sido nada menos que um desastre”, diz Jaap Meijer, analista da Evolution Securities. A corretora recomenda vender as ações do banco.
No fim do ano passado, o Crédit Agricole e outros bancos franceses tinham uma exposição total de US$ 493 bilhões a Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha, segundo dados divulgados este mês pelo Banco de Compensações Internacionais, mais conhecido pela sigla em inglês BIS. É mais do que qualquer outro país, embora a Alemanha não esteja muito distante, com US$ 465 bilhões.
A Europa “continua vulnerável ao contágio”, diz Jacques Cailloux, economista-chefe de Europa do Royal Bank of Scotland. “A maior exposição é a da França.”
A situação mostra como a interligação do setor financeiro da Europa – antes vista como a maior esperança de crescimento econômico sustentável no continente – se tornou o calcanhar de Aquiles da região. Uma crise financeira originada na Grécia, uma economia insignificante na periferia da Europa, semeia agora dúvidas sobre a saúde do sistema financeiro e econômico da região inteira.
O Crédit Agricole passou a maior parte de seus primeiros cem anos de existência concedendo empréstimos a produtores agrícolas empobrecidos e financiando a reconstrução da zona rural da França após a Primeira Guerra.
Seu lema é “Bom senso perto de você“. Em 2006, com a saturação do mercado bancário francês e a expansão das economias de países como a Grécia, o Crédit Agricole embarcou num plano internacional de expansão com foco especial no sul da Europa.
Ele venceu uma disputa para comprar o Emporiki, um deficitário banco estatal grego.
Um executivo do alto escalão do Crédit Agricole disse na época que o acordo refletia “a confiança que temos na economia grega e no crescimento excepcional do setor bancário da Grécia”.
O Crédit Agricole indicou um novo diretor-presidente para o Emporiki, um executivo grego do setor de laticínios chamado Antony Crontiras, sem experiência bancária. Ele, por sua vez, anunciou logo planos de aumentar o crédito do Emporiki e previa crescimento anual de 30% do lucro.
“O Emporiki vai liderar” o crescimento no resto do sudeste da Europa, disse Crontiras numa entrevista coletiva em abril de 2007 em Atenas. Ele disse que a presença do Emporiki em Chipre, na Albânia e na Romênia iria aumentar de 45 agências na época para 309 até 2011.
A expansão desenfreada deixou o Crédit Agricole vulnerável quando a crise financeira se transformou numa recessão mundial. Desde 2006, o Emporiki perdeu quase € 1,5 bilhão. Executivos do Crédit Agricole disseram ontem que o Emporiki vai perder cerca de € 750 milhões este ano e € 130 milhões em 2011. Em outubro, a empresa previa que o Emporiki perderia cerca de € 300 milhões em 2010 e atingiria o ponto de equilíbrio em 2011.
Aproximadamente 18% dos créditos do Emporiki são classificados como “deficitários” e executivos do Crédit Agricole disseram ontem que o índice pode subir para 28% ano que vem. As investidas do Emporiki nos Bálcãs e em Chipre também estão dando prejuízo, informou ontem o Crédit Agricole.
O banco “subestimou os problemas e superestimou a capacidade dele de se expandir no mercado grego”, diz Nickolaos Travlos, diretor da Escola de Pós-Graduação em Administração Alba, em Atenas.
“Se você quer que eu diga que o Emporiki foi um ótimo investimento, não vou falar isso”, disse ontem o diretor financeiro do Crédit Agricole, Bertrand Badre, numa teleconferência de quase duas horas com analistas. Ele disse esperar que o Emporiki saia do vermelho em 2012.
Mas os executivos também disseram ontem que o Emporiki responde por apenas 3% do total de agências e do faturamento da matriz e, por isso, seus problemas não ameaçam a integridade do Crédit Agricole. “Gostaríamos de nos assegurar de que a situação na Grécia não prejudique a visão geral que temos do futuro de nosso grupo”, disse Bruno de Laage, diretor-geral adjunto do banco.
Ao mesmo tempo, os executivos se recusaram a descrever quais são suas vulnerabilidades nos outros países problemáticos no sul da Europa.
Fonte: Valor Online