Como você, somos entusiastas do futuro de nossas Singulares, mas sabemos que é o mercado que definirá o grau de sucesso de nosso posicionamento e a nossa permanência neste cenário. Diante disto, não podemos achar que o cooperativismo de crédito vive em uma redoma de vidro, em que basta uma singular estar melhor “ranqueada” na região do que suas irmãs de mesma bandeira, ou quando muito, competindo entre suas irmãs de outras bandeiras. Esta é uma visão limitada e que compromete o saudável crescimento da singular em seu mercado.
Também, não podemos deixar que nossos líderes fiquem com a visão turva pelo conforto de seus tradicionais “grandes” resultados, em especial com a evolução de suas sobras. Pois neste cenário aparentemente generoso tendem a repetir velhas e engessadas verdades, como aquela que doutrina a não remuneração do capital social.
Somos favoráveis a remuneração do capital social pelos vários motivos tratados no recente artigo: Capital Social e sua não correlação com as Sobras (link). O capital social é um de nossos grandes pilares, portanto é nossa missão geri-lo de forma que seus donos sejam remunerados coerentemente para que se mantenha e evolua.
Reforçamos sempre que estamos em um dos modelos comerciais mais rentáveis do mercado, e sendo assim, remunerar o capital social pela Selic é algo factível e deve ser a meta mínima de todos os gestores. Para clarear ainda mais este nosso ponto de vista, imaginemos que 100% dos recursos emprestados de sua singular fossem obtidos através do repasse da Central. Certamente sua singular pagaria não menos do que 100% da Selic. Então por que não pagar 100% da Selic ao capital social de seus sócios?
Sobra tradicional e seu erro potencial de interpretação
Diante dos argumentos acima, tendemos a incorrer em um grave equívoco de avaliação quanto a performance comercial de nossas singulares. Sim, pois comparamos os valores das sobras divulgadas sem nunca analisarmos se as singulares envolvidas remuneraram ou não seu capital social. Algo que pode mudar abruptamente qualquer análise.
Apregoamos que este amadurecimento mental é urgente já que nos permitirá mais coerência na comparação da eficácia comercial de uma, duas ou mais singulares. Só assim nós, centrais e BC seremos ainda mais criteriosos e assertivos em nossas próximas decisões. Ao balizarmos equivocadamente nossas análises, tendemos a julgar números brutos e não realidades. Um erro que pode ser fatal para nosso modelo de negócio.
Sobra Real
Visando suavizar nossos possíveis erros de interpretação quanto à eficácia comercial de singulares de perfis próximos, propomos a Sobra Real, que é a leitura sempre líquida das sobras. Ou seja: acataremos como Sobra Real as sobras das singulares que remuneraram seu capital social em 100% da Selic. Contudo, caso a singular não o tenha remunerado, ou o feito de forma parcial, deduziremos de suas sobras o custo de remunerar seu capital social em 100% da Selic. Assim, seremos mais assertivos ao equalizamos as comparações das sobras destas singulares.
Obs: caso da singular tenha remunerado em 100% da Selic seu capital social serão iguais os valores da sobra tradicional e da Sobra Real.
Agora vamos analisar com mais coerência a performance comercial de duas singulares de portes parecidos:
- Uma singular apresentou R$ 100.000,00 de sobras e remunerou seu capital social em 100% da Selic.
- A outra apresentou sobras de R$ 500.000,00 (5 x mais que a primeira), mas não remunerou seu capital social, o que lhe custaria R$ 750.000,00. Sim. Esta segunda singular deu um prejuízo de R$ 250.000,00 no conceito de Sobra Real, pois não fez receita nem mesmo para remunerar seu capital social a 100% da Selic.
Portanto, neste cenário, seria coerente aplaudir a Singular que apresentou R$ 100.000,00 de sobras, e não a que apresentou R$ 500.000,00, mesmo sendo este 5 vezes maior pelo conceito tradicional de sobras. Assim, no conceito de Sobra Real, é ineficaz a singular dita “grande”.
Responda: Qual é a singular mais eficaz comercialmente? Qual deveria incorporar qual?
Sobra Real balizando Fusões
Precisamos refletir mais abertamente e sem emoção sobre a proposta de remunerar o capital social pela Selic, buscando sua razoabilidade técnica e comercial, para que assim não minemos nossas decisões estratégicas. Uma destas breves decisões será a que determinará quem “compra” quem nos processos inevitáveis de fusão, já que provavelmente o uso bruto dos números como “ranking” e os outros indicadores tradicionais podem nos remeter a perigosos erros de interpretação. Portanto, propomos a utilização também do conceito de Sobras Reais nas análises de fusão, se possível aplicando-o nas sobras dos últimos anos.
Muito cuidado: os processos de fusões são divisores de água de nosso modelo de negócio e precisam ser conduzidos com enorme astúcia e habilidade, já que as decisões devem ocorrer depois de uma boa “espremida” nos números brutos e indicadores para que confessem se o que sinalizam são ou não defensáveis comercialmente. Aconselhamos reler o artigo: Fusão – Sinônimo de competitividade? (link)
Sobra Real & Governança Cooperativa
A Sobra Real é uma ótima ferramenta na implementação e manutenção da governança cooperativa, já que prove um forte balizador de gestão da singular quanto aos quesitos transparência e coerência comercial. Ou seja, sempre que uma singular se comunicar com seus sócios, inclusive nas AGOs, ou com suas centrais e BC, apresentará além da tradicional sobra, sua Sobra Real.
Reflexões finais
Norteados pela antiga premissa de que grandes números escondem imperfeições, pelo aprendizado no desenvolvimento do conceito da Sobra Real e pelo intenso trânsito neste mercado, acreditamos que a adoção da Sobra Real nos apresentará uma verdade distinta da apresentada pelo tradicional conceito de sobras. Estimamos que 25% delas teriam dado prejuízos, apesar de alegarem ter tido sobras neste último ano. Outras 40% teriam suas sobras reduzidas a menos da metade. E para dar mais claridade a este novo conceito, relembramos que a remuneração do capital social é necessária em nosso modelo de negócio e que, muito em breve, a sua não adoção ficará insustentável comercialmente.
Assim sendo, propomos a você, leitor, que aplique a Selic cheia do último ano sobre seu capital social (caso não o tenha remunerado ou feito parcialmente). Isto lhe permitirá reconhecer sua Sobra Real. Caso você seja de uma Central, Confederação, Banco Cooperativista ou do próprio BC, analise a totalidade das instituições filiadas aplicando o conceito de Sobra Real.
Verá com mais claridade seu cenário, reconhecerá verdadeiramente quantas deram prejuízos, reverá a forma de fazer o ranking de eficácia comercial, poderá adotar medidas mais coerentes de acompanhamento e, até, quem sabe, rever alguns processos em trânsito ou futuros de fusões.
O conceito de Sobra Real explicita as sobras da forma mais próxima da verdade comercial, já que sempre deduz deste valor a remuneração de 100% da Selic para o capital social. Ele foi desenvolvido pela nossa consultoria para ser mais um dos inúmeros indicadores de Governança Cooperativa que já criamos para suportar com mais eficácia e transparência a gestão do cooperativismo de crédito. De forma simples e focada, valida com elevado grau de assertividade a eficácia comercial e de gestão de uma Singular, de um grupo delas, ou, até mesmo, das Centrais, e do BC favorecendo uma visão mais translúcida da totalidade das singulares brasileiras.
Fica a reflexão: As sobras tradicionais devem ter seu conceito revisto, e em seu lugar poderíamos adotar preceitos mais coerentes como o internalizado pelas: Sobras Reais.
Ricardo Coelho Consultoria e Treinamento www.ricardocoelhoconsult.com.br