O cooperativismo, como se sabe, é o único movimento socioeconômico do planeta que se desenvolve sob uma mesma orientação doutrinária, e assim é desde o seu surgimento na primeira metade do Século XIX (1844), em Rochdale, na Inglaterra.
Os direcionadores doutrinários vêm representados especialmente por valores e princípios, adotados em todo o mundo. E o que vem antes!? Os valores, perenes, de raízes mais profundas – a base de toda a estrutura -, precedem e dão origem aos princípios. Estes, por sua vez, traduzem os valores e os levam à prática no meio cooperativo. Os princípios são uma espécie de ponte ligando grandes diretrizes a ações. Para dar a necessária dinâmica e atualidade à doutrina cooperativista, os princípios – diversamente dos valores –- são passíveis de revisão (atualização) na linha de tempo, o que, por sinal, já aconteceu algumas vezes no âmbito da Aliança Cooperativa Internacional (ACI).
Diferentemente dos princípios, delimitados formalmente, não existe rol conclusivo ou exaustivo de valores. Das inúmeras referências feitas por doutrinadores no mundo todo, a enunciação mais recorrente recai sobre a:
1) SOLIDARIEDADE, cuja essência reside no compromisso, na responsabilidade que todos têm com todos, fazendo a força do conjunto e assegurando o bem de cada um dos membros. É uma espécie de reciprocidade obrigacional, justificada pelo interesse comum. Ser solidário é praticar a ajuda mútua (esta, por vezes, aparece como valor autônomo), é cooperar por definição, é tornar o empreendimento sólido.
2) Liberdade, que está no direito de escolha pela entidade cooperativa, tanto na hora do ingresso como no momento da saída, podendo a pessoa, enquanto cooperado, mover-se e manifestar-se de acordo com a sua vontade e consciência, respeitados os limites estabelecidos coletivamente.
3) Democracia, que está diretamente relacionada ao pleno direito de o associado participar da vida da cooperativa em toda a sua dimensão, especialmente pela palavra e pelo voto, implicando, em contrapartida, respeito às decisões majoritárias. Indica também acesso universal, sem discriminação de qualquer espécie. É pela democracia que se exerce a cidadania cooperativa.
4) Equidade, que se manifesta, fundamentalmente, pela garantia da igualdade de direitos, pelo julgamento justo e pela imparcialidade, tanto em aspectos econômicos como sociais.
5) Igualdade, que impede a segregação em razão de condição socioeconômica, raça, gênero ou sexo, ideologia política, opção religiosa, idade ou de qualquer outra preferência ou característica pessoal. A todos devem ser assegurados os mesmos direitos e as mesmas obrigações.
6) Responsabilidade, que tem a ver com a assunção e o cumprimento de deveres. Como cooperada, a pessoa é responsável pela viabilidade do empreendimento, incumbindo-lhe operar com a cooperativa e participar das atividades sociais. Cada qual responde pelos seus atos, devendo conduzir-se com retidão moral e respeito às regras de convívio adotadas coletivamente.
7) Honestidade, que se liga à verdade por excelência. É uma das marcas de pessoas de elevado caráter. Tem a ver com retidão, probidade e honradez. Dignidade, enfim.
8) Transparência, que diz respeito à clareza, àquilo que efetivamente é, sem ambiguidade, sem segredo. No meio cooperativo, todos têm de ter conhecimento preciso sobre a vida da entidade: sua gestão, seus números, suas regras.
9) Consciência socioambiental, que se conecta ao compromisso do empreendimento cooperativo, naturalmente de caráter comunitário, com o bem-estar das pessoas e com a proteção do meio ambiente compreendidos na sua área de atuação, preocupação que envolve desenvolvimento econômico e social e respeito ao equilíbrio e às limitações dos recursos naturais.
A palavra-chave, aqui, é sustentabilidade. Pelo seu significado e a sua atualidade, estuda-se no âmbito da ACI dedicar ao tema um novo (8º) e exclusivo princípio universal do cooperativismo.
Essas, portanto, são as diretrizes mais abrangentes do movimento cooperativista, e que influenciam a elaboração dos princípios e das regras aplicáveis a todas as organizações de natureza cooperativa nos quatro cantos do mundo.
—————–
Ênio Meinen, advogado, pós-graduado em direito e em gestão estratégica de pessoas e autor de vários livros sobre cooperativismo de crédito – área na qual atua há 30 anos -, entre eles “O cooperativismo de crédito ontem, hoje e amanhã” (obra em que baseado este artigo). Atualmente, é Diretor de Operações do Banco Cooperativo do Brasil – Bancoob.