As Cooperativas, por consistirem sociedades de pessoas e não de capital, não têm por objetivo auferir lucro em suas operações. Por outro lado, as empresas mercantis visam alcançar o lucro, para seus integrantes, mediante uma renda proporcional ao capital investido, realizada através de negócios efetuados principalmente com terceiros. Já a concepção do negócio cooperativo é a de que os associados unam esforços, através de uma pessoa jurídica, buscando atingir um objetivo comum. Na hipótese do ramo crédito, os associados buscam, basicamente, ter acesso a operações financeiras de acordo com sua necessidade e/ou do seu negócio, com taxas de juros mais baixas que o mercado financeiro tradicional oferece, além de possibilitar que os recursos sejam investidos e reinvestidos no desenvolvimento de sua região.
As profundas transformações causadas pela revolução industrial, especialmente a substituição do trabalho manual pela máquina, marcado também pelo desemprego e exploração da força de trabalho, foram o embrião para o surgimento de alguns movimentos que buscavam denunciar tais injustiças, bem como propor formas alternativas de organização do trabalho.
Após algumas tentativas que resultaram frustradas, em 1844 na Inglaterra, os chamados pioneiros de Rochdale, em sua maioria tecelões, criaram um novo modelo de negócio, denominado cooperativo. Tal formatação de negócio, adotada em larga escala em diversos países atualmente, continha em sua essência alguns princípios fundamentais e que estão presentes até hoje em tais sociedades, configurando verdadeiras cláusulas pétreas, ou seja, imutáveis.
Os associados buscavam no empreendimento cooperativo, desde os seus pioneiros ingleses, uma forma alternativa, ou a única disponível na época, para suprir suas necessidades, aliado ao aspecto de ser a via mais econômica disponível para o desenvolvimento de determinada atividade mercantil. Importante destacar que os fundadores desejavam que o empreendimento prestasse a devida assistência ao cooperado e sua família, carentes na época de auxílio à educação, formação e treinamento. Nos dias de hoje, referido auxílio está materializado no Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social – FATES, cujo destino de recursos financeiros é obrigatório pelas cooperativas, nos exatos termos do artigo 28, inciso II, da Lei nº 5.764/1971.
Dentre as diversas premissas contidas no novo formato de negócio cooperativo, destaca-se a ausência do objetivo de auferir lucro, mas guardando, em sua essência, o foco em desenvolver a pessoa do cooperado. Assim, havendo excedentes ao final do exercício, estabeleceu-se que tais recursos deveriam retornar para os cooperados. Tais excedentes estão materializados nas chamadas sobras, resultantes da diferença positiva entre os recursos adiantados pelos cooperados, deduzidas as despesas da operação da cooperativa.
Segundo Walmor Franke, um dos principais atores na elaboração do projeto de lei que resultou na edição da Lei nº 5.764/1971, na obra intitulada Direito das Sociedades Cooperativas, leciona que as sobras advém do princípio do retorno, ou seja, quanto maior a quantidade de operações que o associado fizer com a cooperativa, maior será a devolução de recursos a título de sobras.
Assim, as sobras advém das operações realizadas pelos associados, por intermédio das cooperativas, visando atingir o objetivo pelo qual a sociedade foi instituída e que, conforme visto, não consiste auferir lucro. Talvez seja por tal característica que se propaga aquela máxima, um tanto conhecida, de que são os associados que possuem a cooperativa e não a cooperativa que possui associados.
Por fim, ainda que de forma muito breve, busca-se através do presente texto abordar a relevância de se colocar em prática os princípios do cooperativismo, atualmente expressos no artigo 4º da Lei nº 5.764/1971, dentre os quais destaca-se a distribuição das sobras para os associados.