Potencial deste segmento está na capilaridade de fornecimento de crédito a pequenas e médias empresas no interior brasileiro.
Na última reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), no final de agosto, foi aprovado um voto que não despertou maiores atenções e teve repercussão limitada, particularmente por ser árido e técnico.
Em resumo, a medida permitiu que as cooperativas de crédito no Brasil possam emitir Letras Financeiras (LF) para captação de recursos. Quem é da área comemorou. Quem não é deveria comemorar também.
A medida é mais um passo na transformação desse segmento, que vem crescendo exponencialmente. As cooperativas de crédito estão se consolidando como opção viável de competição bancária, uma alternativa aos grandes bancos e instrumento para reduzir as taxas cobradas dos clientes. Com o dinheiro mais barato, toda a sociedade se beneficia.
As Fintechs — empresas que trabalham para inovar e otimizar serviços do setor financeiro — costumam ser apontadas como principal ator que vai sacudir esse mercado. Mas um ex-diretor do Banco Central lembra que, ao crescerem, a maioria dessas startups acaba sendo incorporada pelos grandes bancos. “São as cooperativas que realmente vão proporcionar a competição”, diz ele.
Para a maior parte das pessoas que moram nas grandes cidades, as cooperativas podem parecer algo novo. Só que são uma novidade de 117 anos. Para registro, a primeira cooperativa de crédito no País (e na América do Sul) foi aberta em 1902, em Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul.
No interior do Brasil, elas são uma realidade que pode ser contada em grandes números. Têm 10,5 milhões de associados – 150% a mais que os 4,1 milhões em 2010 —, empregam 60 mil pessoas e atuam em 6.200 postos em todo o país.
Em 2018, o incremento da carteira de crédito delas foi de 23%, enquanto o resto do Sistema Financeiro se expandiu 7%. “Esse crescimento foi superior a todos os segmentos de instituições financeiras nos últimos cinco anos, considerando as modalidades de crédito de varejo”, atesta o BC.
O potencial das cooperativas está nessa capilaridade de fornecimento de crédito a pequenas e médias empresas no interior brasileiro. Elas estão em 200 municípios onde não existe nenhuma agência bancária e acrescentaram R$ 9,7 bilhões de crédito ao estoque de recursos para pequenas e médias empresas no ano passado.
No último ranking Valor 1000, divulgado em agosto pelo jornal Valor Econômico, o Sicoob e o Sicredi (os dois maiores sistemas existentes no país) aparecem entre os dez maiores bancos. Somadas, todas as cooperativas já são o sexto banco brasileiro, atrás do Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Caixa e Santander.
O que oferecem para ganhar tal projeção? Como as tradicionais “caixinhas”, elas são administradas pelos associados, permitem atendimento direto ao cliente, com um custo menor e taxas competitivas. Organizadas em grandes sistemas ou de forma independente, as cooperativas têm garantias parecidas às de um banco tradicional. Não procuram ter lucro — precisam garantir que suas receitas banquem as despesas. Se houver sobras, elas retornam aos associados.
O governo está de olho nesse setor. A medida do CMN de agosto dará mais capacidade para essas cooperativas captarem recursos para emprestar. Em abril, elas já haviam sido autorizadas a captar depósitos de poupança rural, o que também amplia suas fontes de dinheiro.
Para o futuro próximo, a estratégia é expandi-las para as grandes cidades e as regiões Norte e Nordeste. Em junho, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, apresentou metas ambiciosas para 2022: aumentar a participação dessas cooperativas no sistema de crédito dos atuais 8% para 20% e ampliar dos atuais um terço para metade o número dos cooperados que ganham até dez salários mínimos. Vem briga boa por aí.
Fonte: epoca.globo.com