As crises mudam as formas de interação e troca de valores da sociedade e, nesse cenário atual, derivado da pandemia do Covid-19, a união de esforços surge como uma alternativa de sustentação do novo rumo de mercado que está por vir.
Nesse ritmo inesperado e com as implementações das medidas do isolamento social, necessárias para conter o avanço do coronavírus, o comportamento dos consumidores mudou drasticamente e uma das mudanças mais observadas foi a valorização do consumo local.
O comércio sempre foi um fator de suma importância para o desenvolvimento local, principalmente no que se refere à geração de empregos, portanto, quanto maior a atividade, maiores oportunidades de trabalho, empreendimentos e demanda de novos colaboradores. Logo, podemos concluir que incentivar a economia local, além de gerar benefícios e movimentar o mercado, traz vantagens para os consumidores e empreendedores, gerando mais visibilidade, sustentabilidade e possibilidades de bons negócios em uma determinada região.
Porém, para que o crescimento seja iminente, é necessário um processo de cooperação e ajuda mútua dentro dessa relação mercadológica. O apoio das empresas entre si, até mesmo em ações rotineiras como, por exemplo, a procura e escolha por fornecedores locais, ajuda a fortalecer a economia, demandar mais mão de obra e, consequentemente, estreitar o relacionamento com a população. “Pensando que o consumo é um dos principais fatores do crescimento da economia brasileira e que as comunidades detêm esse poder ao longo da história, estão nelas também as respostas de uma nova ordem econômica, aquela em que a coletividade é empreendedora e planejadora”, afirmou o gerente jurídico do Instituto Humanitas 360, Higor Cauê de Souza Oliveira.
Essa relação, que estabelece um ciclo econômico sustentável, já está enraizada no movimento cooperativista, fazendo parte efetivamente de dois dos sete princípios que contemplam esse modelo, são eles: A intercooperação (6˚princípio) e o Interesse pela Comunidade (7˚princípio). Juntos, os dois propósitos buscam alavancar o desenvolvimento equilibrado das próprias comunidades e o bem-estar de suas populações. “No cenário turbulento que estamos vivendo, fica ainda mais evidente o quanto a cooperação e o cooperativismo de crédito fazem a diferença e o quanto são fundamentais para o Brasil atravessar esse período desafiador”, ressalta o Vice-Presidente da Central Sicredi Sul/Sudeste, Márcio Port.
Quando nos referimos ao aspecto regionalizado, os micro ou pequenos negócios, que representam praticamente 90% dos empreendimentos no país, contribuem diretamente para a consolidação da economia, ocupando uma ampla fatia de participação no nosso PIB, sendo aproximadamente 30%. “Quando me refiro ao aspecto regionalizado, isso na prática é um efeito em cascata, ou seja, grande parte da economia gerada por essas empresas, fica na região onde atuam e como uma cascata afeta diretamente os demais setores, contribuindo significativamente na geração de receitas, empregos e a continuidade desse ciclo”, comenta o Diretor Administrativo Financeiro e gerenciamento de risco do Sicoob Coocrelivre, Rodolfo Lombardi Archangelo.
Contudo, os desafios do consumo local estão postos e não se limitam apenas a micro e pequenos negócios, “há uma tendência de consumo mais consciente, com responsabilidade social, que tende a ser imperativo pós-crise: comprar de empresas que atuam pelo bem das comunidades à sua volta, garantir a sustentabilidade local e resultados positivos para ambos os lados. É um desafio para todos, do local ao mais global”, completa Higor.
Entretanto, quando falamos em regionalização, é impossível não falar sobre como as cooperativas sempre impactam positivamente as comunidades onde estão inseridas. Em uma recente pesquisa encomendada à Fipe pelo Sicredi e disponibilizada por sua assessoria, chegou-se a conclusão que as cooperativas incrementam o PIB em média de 5,6% nas localidades onde estão instaladas e fazem jus à fama do setor em trazer à tona a evolução, efetivando práticas através de programas educacionais, sociais, culturais e financeiros, sempre visando a melhoria da sociedade como um todo. “Esse é o nosso DNA! São valores que visam um futuro mais equilibrado, com o propósito de transformar a sociedade de forma mais justa e com oportunidade para todos”, acrescentou Rodolfo.
“O sistema cooperativista contribui ao papel social de trazer os cidadãos para o centro das forças e do diálogo, para buscar soluções em meio ao movimento geral dos setores mais avançados que por vezes se reúnem para controlar o mercado. Exercer papel social neste sentido é não fugir das responsabilidades por fazer parte de uma comunidade – mas sim construir sustentabilidade para todos no entorno, entender a realidade comunitária como parte do seu próprio trabalho.” – Higor Cauê de Souza Oliveira.
Para dar visibilidade e estimular esse consumo que vem crescendo cada vez mais no país, muitas ações estão sendo colocadas em prática para conscientizar a população da necessidade de fomentar o desenvolvimento da comunidade. Campanhas como o “Eu Coopero com a Economia Local”, implementado pelo Sicredi e o “Enfrentar e Cooperar”, lançado pelo Sicoob Coocrelivre em parceria com o Sebrae, tem feito uma diferença significativa nesse processo. “Acreditamos que este momento de crise traz à tona valores que são inerentes ao cooperativismo, a partir desse novo despertar para a importância do engajamento com a comunidade e intercooperação entre as pessoas e entidades”, complementou Márcio.
O consumo e a transformação digital
Com uma impactante transformação digital acelerada pelo processo da pandemia, os empreendimentos se viram no papel de se reinventar diariamente para conseguir uma melhor adequação na nova rotina estabelecida na sociedade. E quando trazemos esse aspecto para o consumo, novas plataformas e aplicativos vem surgindo e se mobilizando para auxiliar as interações comerciais no ambiente e-commerce. “Já identificávamos o comércio eletrônico como uma tendência e, com a pandemia do novo coronavírus, isso tomou uma proporção ainda maior. Empreendedores estão cada vez mais aderindo aos ambientes digitais para seus negócios”, afirmou Márcio.
Porém, quando a questão é o cooperativismo, ainda existe um grande receio do movimento perder sua essência e seu principal diferencial: o relacionamento humano. “Nos últimos anos a transformação digital das cooperativas está em uma crescente e com muita qualidade, considerando que temos que dar praticidade e facilidade aos nossos associados, além de alternativas de atendimento, porém sem abrir mão do relacionamento e “olho no olho”, extremamente essencial, principalmente no mundo tão digitalizado como de hoje”, comentou Rodolfo.
Com essa nova realidade virtual, a busca por praticidade tem aumentado frequentemente e algumas facilidades trazidas nesse ambiente auxiliará as micro e pequenas empresas no desafio do desenvolvimento do consumo local através de alternativas inovadoras, como novos modelos de negócios e inteligência artificial. “A confiança no relacionamento é a palavra que segue forte no cooperativismo e persistiu nesse momento, mesmo avançando a passos largos no ambiente digital, avançamos rapidamente porque nossos associados acreditaram naquilo que o cooperativismo financeiro estava proporcionando e tinham uma causa, permanecer com o cordão umbilical ligado, sem perder a essência, mas sim com uma interação dinâmica e virtual diferenciada”, complementou Rodolfo.
Desenvolvimento local e sustentável
A transformação econômica e social devem caminhar de mãos dadas quando falamos em desenvolvimento local, o que engloba, como um todo, questões de inclusão e educação dentro de uma comunidade. E nesse processo de aproximação, o Brasil, bem como o mundo, tem uma grande responsabilidade a ser cumprida. “A importância está primeiro na transformação econômica e social de localidades esquecidas ou inferiorizadas. Segundo, na projeção do foco na comunidade com ações sociais que as atendem diretamente. Terceiro, na injeção de poder econômico nesta massa que mais movimenta a economia. Empreender coletivamente é uma forma de planejar modelos de negócios viáveis ao mercado brasileiro e mundial”, comenta Higor demonstrando o projeto da Humanitas 360 que visa a inclusão da população carcerária no mundo do trabalho.
O movimento cooperativista terá um papel fundamental no fortalecimento da sociedade e de grandes transformações no futuro pós-pandêmico. E nesse novo ciclo “normal”, onde as relações serão freadas, é necessário ter um propósito de busca por oportunidades para auxiliar o crescimento estrutural da comunidade como um todo. “A empatia, habilidade tão desejada e necessária neste momento, sempre foi de forma intrínseca uma habilidade cooperativista, se colocando no lugar do associado e nesse momento sentindo suas “dores”, colaborando no planejamento financeiro e juntos pela retomada de suas atividades”, afirmou Rodolfo.
As mudanças que já estão acontecendo no mundo trazem consigo um futuro de incertezas e com isso, os propósitos e estratégias tiveram que ser alterados e ressignificados através de uma cultura de cooperação, onde novos projetos contribuirão para a promoção da solidariedade e da empatia. E nesse processo, é importante lembrar que todos estão ligados a uma mesma estrutura e movimentam o mesmo ciclo, não há como propagar o global sem antes desenvolver o local.
Fonte: Revista MundoCoop – por Jady Mathias Peroni
Juntos pelo consumo local!