“O cooperativismo brasileiro está up to date com o que há de melhor no mundo inteiro. Há cooperativas agropecuárias e de crédito modernas, agregando valor com mecanismos muito rigorosos de controle. Nós estamos assumindo posições bastante relevantes no cenário global.” (Roberto Rodrigues, ex-presidente da Aliança Cooperativa Internacional – ACI)
De pronto, indicando o núcleo destas ligeiras ponderações, proponho a seguinte pergunta: e se invertêssemos o rumo e incluíssemos novas alternativas nas rotas dos intercâmbios de estudos/aprendizagem sobre o cooperativismo?
O motivo principal da indagação (com viés propositivo!) deriva de uma importante constatação: parcela substantiva de cooperativistas brasileiros que ultimamente têm incursionado mundo afora com a pretensão de buscar novidades associadas ao cooperativismo, sobretudo na seara financeira, alega pouco apreender que, de relevante, possa ser reproduzido ou repercutido internamente.
Muitos dos intercambistas ainda afirmam que já detemos conhecimento e reunimos inúmeras boas práticas, e que teríamos condições de inspirar lideranças e executivos de as entidades coirmãs de diferentes países, retribuindo em parte os ensinamentos que outrora colhemos com os anfitriões de instituições e territórios pioneiros.
De fato, há uma percepção (uníssona, eu diria) de que o cooperativismo brasileiro tem acumulado um conjunto substantivo de experiências meritórias – especialmente no que se refere (i) à aplicação da cartilha doutrinária (notadamente quanto ao 2º e 7º princípios); (ii) ao formato organizacional sistêmico; (iii) à inovação e versatilidade; ao (iv) ao modelo regulatório e relacionamento institucional vanguardistas e, como decorrência, (v) à velocidade e constância da expansão –, não reveladas ao redor do globo. Uma entre tantas outras evidências de que avançamos de modo a sermos referência em múltiplos aspectos da nossa atuação é a da receptividade dos depoimentos em congressos mundiais: as participações de profissionais daqui são sempre bastante aguardadas e saudadas.
Aliás, mesmo na ausência de qualquer ação institucional que promova o caminho inverso, tem-se percebido recentemente algumas iniciativas externas, espontâneas, de aproximação em busca de respostas por aqui para diferentes desafios filosóficos, societários e operacionais do negócio cooperativo.
Nessa direção, em recente pronunciamento, o presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e membro do atual board da ACI, Márcio Lopes de Freitas, revelou que o universo cooperativista vem olhando para nós com muito entusiasmo, reconhecendo e admirando o que estamos fazendo. Não devemos, portanto, reprimir ou abrandar a autoestima ou menosprezar as qualidades que hoje colecionamos, lembrando do que nos ensinou o escritor e dramaturgo Nélson Rodrigues no final dos anos 1950 (ao cunhar a expressão “complexo de vira-lata”).
Esse quadro sugere que, em vez de apenas decolarmos para além das fronteiras nacionais, também estimulemos, nomeadamente por meio de nossas entidades de representação e fomentadoras de intercâmbios/viagens (unidades do sistema OCB e organizações intrassegmentos, por exemplo), incursões e imersões de lá para cá, jogando luz sobre os atributos do nosso empreendedorismo cooperativo.
E mais do que isso: que incentivemos as jornadas intrapaís, descortinando e compartilhando alguns dos muitos cases virtuosos distribuídos pelos diferentes ramos cooperativos nos quatro cantos do Brasil – infelizmente ainda sabemos pouco do que se faz intrafronteiras, tendo muitas oportunidades para aqui aprender e ensinar.
Enfim, não precisamos ir tão longe tendo soluções geograficamente mais próximas de nossas casas/bases e entre si menos distantes ou coincidentes em aspectos históricos, econômicos, sociais, culturais, legais, entre outros.
Entre os muitos benefícios desse ajuste de roteiro, teríamos:
1) no acolhimento de cooperativistas e demais convidados de fora:
a) economia de recursos dos cooperados (considerando a redução de idas ao exterior);
b) otimização de tempo, sem prejuízo do aprendizado com os visitantes (é como se fôssemos até eles);
c) impacto econômico positivo pelo ingresso de divisas em dólares, euros e outras moedas;
d) maior visibilidade e ampliação do protagonismo do cooperativismo brasileiro em escala global;
e) resgate da dívida moral que contraímos ao longo dos anos com os nossos (então) anfitriões.
2) nas interlocuções internas (intrarramos ou inter-ramos):
a) valorização do que fazemos bem por aqui;
b) possibilidade de rápida implementação das medidas de sucesso (como fazer), dado que já adaptadas à nossa realidade;
c) aprendizagem com os erros que cometemos e assim não recorrermos neles (como não fazer);
d) estreitamento das relações entre cooperativas (em fidelidade ao princípio da intercooperação), incluindo possíveis parcerias intercooperativas, dentro ou fora de um único segmento;
e) como corolário, o fortalecimento do ecossistema cooperativo nacional.
Nessas aproximações entre nós, poderíamos contemplar visitas a cooperados e a projetos seus impulsionados pelas cooperativas, bem como ver de perto os efeitos de ações voltadas à coletividade comunitária. Por fim, isso nos permitiria saber mais sobre a nossa matriz produtiva, partilhar da (ampla) diversidade cultural/social e desfrutar dos nossos inúmeros atrativos turísticos (objetivo sempre presente nos destinos internacionais), irrigando igualmente a economia local/regional.
Vale ressalvar que as presenças nos grandes eventos globais de congregação do cooperativismo por meio de dirigentes, executivos e outros personagens envolvidos com o movimento continuam sendo de todo recomendáveis e devem ser intensificadas.
Congressos a exemplo dos promovidos pelo Woccu (Conselho mundial de cooperativas financeiras) e pela CIPB (Confederação internacional de bancos populares e cooperativos), bem como a integração associativa com tais entidades, permitem a conexão com cooperativas coirmãs de diferentes nacionalidades e seus bons feitos, além do contato com temas contemporâneos explorados por experts do mercado. Nesses fóruns podemos também mostrar o que causamos de mais impactante por aqui e, é claro, aproveitar as ocasiões para – inclusive mediante proclamações no contexto dos certames e das interações ordinárias – oferecer-nos e as nossas entidades para acolher visitantes de todas as partes do globo.
Que tal, então, em uma perspectiva reversa e diversa, começarmos a traçar novos planos de voos, recepcionando mais comitivas e atores estrangeiros e dando ênfase a itinerários locais já a partir deste ano?!
Por Ênio Meinen