Esse estudo busca analisar se é devido o pagamento de contribuição previdenciária (cota patronal) a membros de cargos estatutários das cooperativas.
De início, é importante ressaltar que, em regra, todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas (§ 2º do art. 12 da Lei nº 8.212/91).
De outra parte, qualquer que seja o tipo de cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados (art. 90 da Lei nº 5.764/71).
Ora, se não existe vínculo empregatício entre o associado e a cooperativa, qual será o vínculo havido entre associados eleitos em assembleia para cargos estatutários e a sociedade, relativamente à legislação previdenciária ?
A vinculação previdenciária dos associados de cooperativas de crédito eleitos em assembleia para ocupar postos nos conselhos de administração e fiscal, em princípio, será de contribuinte individual.
Neste contexto, é importante verificar o que o legislador brasileiro dispôs a respeito dos segurados obrigatórios do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, conforme se pode observar da alínea “f” do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, e do art. 9º, V, i, do RPS , aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 1999, segundo os quais os membros dos conselhos de administração e fiscal de sociedades cooperativas de crédito não são segurados obrigatórios da previdência social.
Contudo, apesar da clareza dos dispositivos anteriormente mencionados, o legislador infralegal, por intermédio do art. 8º, XII, d, e, e XIII da Instrução Normativa RFB nº 2.110, de 17 de outubro de 2022, de forma indevida, alargou o rol de segurados obrigatórios da previdência social, incluindo o membro de conselho fiscal de sociedade ou entidade de qualquer natureza, o que malfere um dos princípios basilares do Direito Tributário, ou seja, o princípio da tipicidade cerrada, consoante dispõe o inciso II do art. 5º da Constituição da República e inciso I do art. 150, do mesmo diploma legal.
Ou seja, a IN RFB invadiu área de competência exclusiva de lei.
A norma infralegal, embora equivocada em alguns pontos, também trouxe ao mundo jurídico importantes esclarecimentos, como, por exemplo, o de que o membro de conselho de administração na sociedade anônima ou o diretor não empregado que, participando ou não do risco econômico do empreendimento, será eleito por assembleia geral dos acionistas para cargo de direção na sociedade anônima.
Com efeito, o intérprete não pode nunca perder de vista que, nesse tipo societário, a diretoria executiva, na qualidade de órgão estatutário, é subordinada ao conselho de administração, conforme dispõe o § 2º do art. 5º da Lei Complementar nº 130, de 17 de abril de 2009, com a redação dada pela Lei Complementar nº 196, de 2022, e sua eleição se dará por intermédio do próprio conselho de administração, que escolherá, na verdade, pessoas naturais associadas ou não para compor o referido colegiado.
Nesta linha de raciocínio, a regra do inciso XIII do art. 8º da IN RFB nº 2.110, de 2022, não se adequa aos diretores executivos das sociedades cooperativas de crédito, tendo em vista que eles não são eleitos pelas assembleias gerais, a exemplo dos diretores de sociedades anônimas, mas, sim, escolhidos interna e externamente pelo conselho de administração, consoante o disposto no § 2º do art. 5º da LC nº 130, de 2009.
Nota-se, porém, que falta amparo legal para o enquadramento de conselheiros de administração e fiscal de sociedades cooperativas de crédito, bem como de seus diretores executivos, como segurados obrigatórios da previdência social.
Contudo, apesar da clareza dos dispositivos legais que disciplinam o assunto, é sabido que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) do Ministério da Fazenda, bem como o Superior Tribunal de Justiça – STJ, consolidaram jurisprudência contrária à pretensão das sociedades cooperativas, sob a alegação de que a contribuição previdenciária incidirá no pagamento de cédulas de presença de membros de conselhos e de diretorias das sociedades, tendo em vista que são tributáveis as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, relativas aos serviços prestados à própria cooperativa por diretores ou por membros dos conselhos de administração ou fiscal.
Acontece, porém, que não é o associado que presta serviço à cooperativa, conquanto é a cooperativa que presta serviços aos associados, segundo a dicção do art. 4º da Lei nº 5.764, de 1971.
Existe, assim, um vácuo interpretativo quando o assunto diz respeito às sociedades cooperativas. A realidade dessas sociedades no âmbito tributário-previdenciário constitui uma situação deplorável no ambiente jurídico brasileiro. Enquanto não houver um comprometimento sério do Poder Público para a apuração da verdade real em matéria tributária, as sociedades cooperativas continuarão a pagar tributos indevidamente.
Amílcar Barca Teixeira Júnior é advogado, Pós-Graduado em Gestão de Cooperativas, em Direito Tributário. É autor do livro: Cooperativas Financeiras Aspectos Jurídicos e Operacionais Coletânea de Pareceres e Artigos.