Conheça o Crédit Agricole, o gigante banco cooperativo francês que é referência para o cooperativismo mundial por sua forma de atuação e liderança no mercado financeiro da França.
A França é, hoje, o país com o maior nível de penetração do cooperativismo de crédito no mundo: mais de 60% do mercado financeiro está sob controle de instituições cooperativas. Isso significa que dois a cada três franceses são cooperados, uma evidência do enraizamento dessas organizações na sociedade.
O Crédit Agricole nasceu no fim do século XIX, em resposta à exclusão bancária enfrentada por milhões de agricultores franceses. A primeira Caisse Locale de Crédit Agricole foi fundada em 23 de fevereiro de 1885, em Salins-les-Bains, no departamento de Jura, por iniciativa de Alfred Bouvet e Louis Milcent. Posteriormente, a Lei de 5 de novembro de 1894 autorizou a criação de Caisses Locais em todo o território nacional.
Inspirado no modelo de Friedrich Wilhelm Raiffeisen, o grupo consolidou-se como o principal braço financeiro do setor agrícola francês, com atuação decisiva na modernização do campo e na reconstrução econômica pós-guerra.
Estrutura em três níveis: um modelo federativo sólido
O sistema do Crédit Agricole é composto por três níveis interdependentes:
- Caisses Locales: estruturas de base associativa com a missão de representar os associados e fortalecer o vínculo comunitário. Funcionam de forma semelhante aos núcleos de representação adotados por cooperativas brasileiras, como o Sicredi.
- Caisses Régionales: 39 cooperativas regionais com autonomia administrativa, financeira e estratégica.
- Crédit Agricole S.A. (CASA): holding financeira que integra as atividades especializadas, como banco corporativo, seguros, leasing e gestão de ativos.
Esse modelo garante autonomia local com unidade estratégica, permitindo que o grupo seja cooperativo na essência e competitivo em escala global.
Federação Nacional: a voz política e estratégica do sistema
A Fédération Nationale du Crédit Agricole (FNCA) representa todas as Caixas Regionais em nível nacional. Atua como instância de articulação política, estratégica e institucional, exercendo funções como:
- Representar o sistema perante o governo, reguladores e instituições europeias;
- Defender os interesses do cooperativismo em temas regulatórios e setoriais;
- Promover a coesão entre as Caixas Regionais e fortalecer a identidade cooperativa;
- Apoiar a formação de dirigentes e conselheiros.
A FNCA não interfere na gestão das cooperativas, mas desempenha um papel essencial na integração sistêmica do grupo.
Governança cooperativa e controle sistêmico
Os cooperados elegem representantes nas Caixas Locais, que participam da governança das Caixas Regionais e da estrutura central. A Crédit Agricole S.A., mesmo sendo listada em bolsa, permanece sob controle das cooperativas, preservando a natureza cooperativa do grupo.
O processo eleitoral é estruturado e transparente, com forte participação da base associativa e renovação constante das lideranças.
Presença física e relacionamento com o associado
Em uma área geográfica do tamanho da Bahia, ou de Minas Gerais, o Crédit Agricole mantém mais de 8.000 agências espalhadas pelo território francês, com forte presença em áreas rurais e pequenas cidades. Essa presença física é vista como um diferencial estratégico e não como um custo.
O atendimento é baseado em confiança, proximidade e conhecimento das realidades locais. Além disso, não há concorrência territorial entre Caixas: cada uma atua com exclusividade em sua região, o que reforça a cooperação interna.
Especialização e diversidade de atuação
O grupo Crédit Agricole se destaca em vários segmentos, com destaque para sua forte atuação no crédito imobiliário. É um dos principais financiadores habitacionais da França, com soluções acessíveis e adaptadas à realidade local.
Outras subsidiárias especializadas incluem:
- LCL (Le Crédit Lyonnais) – banco de varejo urbano;
- Amundi – uma das maiores gestoras de ativos da Europa;
- CA-CIB – banco corporativo e de investimento;
- Predica e Pacifica – empresas de seguros e previdência;
- BforBank – banco 100% digital.
Internacionalização com raízes cooperativas
O Crédit Agricole atua em mais de 50 países, com presença relevante na Itália, Polônia, Marrocos, Egito e Grécia. Em centros financeiros globais, como Nova Iorque e Tóquio, opera com foco em crédito estruturado e financiamento verde.
Processo colegiado de decisão e mobilidade entre lideranças
As decisões estratégicas do Crédit Agricole são tomadas em instâncias colegiadas, com reuniões mensais entre os 39 diretores das Caixas Regionais e a holding. O grupo estimula mobilidade executiva, permitindo que líderes e especialistas circulem entre regiões e diferentes entidades do sistema, promovendo intercâmbio de experiências e unidade cultural.
Compromisso com a sustentabilidade
Entre as metas ambientais e sociais do grupo, destacam-se:
- Neutralidade de carbono na carteira de crédito até 2050;
- Financiamento à agricultura regenerativa e energias renováveis;
- Liderança na emissão de green bonds na Europa.
Inovação com propósito cooperativo
O Crédit Agricole inova sem perder sua essência. Através da BforBank e de laboratórios internos, investe em soluções digitais, open banking, automação de crédito e IA, mantendo a integração com a rede física e o atendimento humano.
Dados atuais e desempenho financeiro
- 53 milhões de clientes no mundo;
- 147.000 colaboradores;
- Mais de 2 trilhões de euros em ativos sob gestão;
- Lucro líquido de 6 bilhões de euros em 2023.
Resiliência em tempos de crise
Durante a crise de 2008 e a pandemia de COVID-19, o grupo atuou como força estabilizadora, mantendo o crédito e apoiando seus associados. Sua estrutura cooperativa provou ser resiliente e solidária nos momentos mais difíceis.
Uma referência global para o cooperativismo brasileiro
Para o cooperativismo de crédito brasileiro, conhecer o Crédit Agricole é olhar para um futuro possível: escalável, competitivo e fiel aos princípios cooperativistas. Um sistema moderno, enraizado na comunidade e preparado para os desafios do século XXI.
Mais do que um banco, o Crédit Agricole é a prova viva de que o cooperativismo pode ser grande sem perder sua alma.
Por Márcio Port, presidente do conselho de administração da Central Sicredi Sul/Sudeste.