Guia Completo sobre a Resolução 4.910/21, Segmentos S1/S2/S3 e Melhores Práticas de Governança
Introdução
A criação do comitê de auditoria em cooperativas de crédito representa um marco na governança do sistema cooperativo brasileiro. Com a publicação da Resolução CMN 4.910/2021, o Banco Central estabeleceu critérios claros para a obrigatoriedade, composição e funcionamento desses comitês, alinhando o setor às melhores práticas do mercado financeiro nacional e internacional.
Este artigo apresenta, de forma completa e didática, tudo que dirigentes, conselheiros e profissionais do cooperativismo precisam saber sobre o tema:
- O que mudou com a Resolução 4.910/21;
- Quem está obrigado a criar comitê de auditoria;
- O que são os segmentos S1, S2, S3;
- Passos para implantação do comitê;
- Requisitos, atribuições e melhores práticas;
- E como transformar o comitê de auditoria em diferencial competitivo para sua cooperativa.
1. O que é o Comitê de Auditoria em Cooperativas de Crédito?
O comitê de auditoria é um órgão colegiado, independente, criado dentro da estrutura de governança da cooperativa de crédito, com o objetivo principal de monitorar, avaliar e aprimorar os controles internos, a gestão de riscos e a confiabilidade das informações financeiras.
Esse comitê atua como elo entre o conselho de administração, a diretoria e as auditorias interna e externa, sendo responsável por acompanhar questões estratégicas de integridade, transparência e conformidade com normas e regulamentos.
Após a Resolução 4.910/21, a presença do comitê tornou-se obrigatória para cooperativas de maior porte e complexidade, o que representa um salto de maturidade no setor cooperativo.
2. Qual a importância do Comitê de Auditoria?
O comitê de auditoria é fundamental para:
- Assegurar a independência e efetividade das auditorias interna e externa;
- Avaliar a qualidade dos controles internos e o gerenciamento dos principais riscos (crédito, liquidez, operacional, cibernético, socioambiental, etc.);
- Acompanhar a elaboração e divulgação das demonstrações financeiras, prevenindo erros e fraudes;
- Facilitar o diálogo entre o conselho, a diretoria e os auditores, garantindo respostas ágeis e transparentes a qualquer sinal de anomalia;
- Promover uma cultura ética e de integridade, reforçando a imagem institucional e a confiança dos cooperados, reguladores e sociedade.
3. O que mudou com a Resolução 4.910/21?
Antes da Resolução 4.910/21, a maioria das cooperativas de crédito não era obrigada a manter comitê de auditoria. Essa exigência era restrita a bancos de grande porte ou conglomerados financeiros, ficando de fora a imensa maioria do cooperativismo de crédito.
A Resolução 4.910/21, publicada pelo Conselho Monetário Nacional em junho de 2021, tornou obrigatório o comitê de auditoria nas cooperativas classificadas nos segmentos S1, S2 e S3, alinhando as cooperativas de maior porte ao mesmo padrão regulatório dos bancos e instituições financeiras relevantes. Para cooperativas menores (S4/S5), a constituição do comitê continua facultativa.
Além disso, o normativo detalha as atribuições, requisitos de composição, critérios de independência, mandato, vedações e procedimentos para instalação e funcionamento do comitê, trazendo um roteiro claro para implantação, fiscalização e extinção.
4. Quem é obrigado a criar o Comitê de Auditoria?
Segmentos S1, S2, S3: entenda a classificação do Bacen
O Banco Central divide as instituições financeiras, incluindo as cooperativas de crédito, em segmentos conforme seu porte e relevância sistêmica. Essa segmentação define o rigor das exigências regulatórias, inclusive a obrigatoriedade do comitê de auditoria.
Veja como funciona:
- Segmento S1 (instituições de grande porte ou sistêmicas):
Cooperativas líderes de conglomerados prudenciais com ativos totais iguais ou superiores a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, ou que, por decisão do Bacen, tenham importância sistêmica. - Segmento S2 (médio porte):
Cooperativas líderes de conglomerados com ativos totais iguais ou superiores a 1% e inferiores a 10% do PIB. - Segmento S3 (pequeno a médio porte):
Cooperativas líderes com ativos iguais ou superiores a 0,1% e inferiores a 1% do PIB. - Segmentos S4 e S5:
Cooperativas com ativos inferiores a 0,1% do PIB, normalmente dispensadas da obrigação, salvo se optarem por adotar o comitê voluntariamente.
A classificação é revisada anualmente pelo Banco Central, com base nos dados consolidados de ativos totais. Assim, cooperativas que crescem e mudam de segmento passam a ter novas obrigações – e, inversamente, cooperativas que encolhem podem ser desobrigadas, desde que sigam os trâmites formais.
Importante: Se a cooperativa faz parte de um sistema (ex: Sicredi, Sicoob, Cresol, Unicred), muitas vezes o comitê pode ser centralizado, valendo para todas as singulares do sistema – desde que expressamente permitido na estrutura de governança.
5. Como implantar o Comitê de Auditoria?
Passo a passo prático para cooperativas de crédito
A seguir, um roteiro detalhado para implantação do comitê de auditoria em cooperativas enquadradas nos segmentos S1, S2 ou S3:
- Atualização do Estatuto Social: Inclua no estatuto as regras para criação, composição, funcionamento e competências do comitê de auditoria, conforme Resolução 4.910/21.
- Eleição dos Membros: Eleja pelo menos 3 integrantes, preferencialmente com perfis diversos e ao menos 1 com comprovada experiência contábil.
- Cadastro e Registro: Após eleição, registre a ata na Junta Comercial e cadastre o comitê no sistema Unicad do Banco Central, aguardando homologação.
- Elaboração do Regulamento Interno: Detalhe as rotinas, periodicidade das reuniões, critérios de remuneração, regras de funcionamento e demais pontos operacionais.
- Posse e Capacitação: Após homologação, dê posse aos membros e promova treinamentos em auditoria, riscos, controles internos e governança.
- Comunicação e Transparência: Divulgue, sempre que exigido, a existência e composição do comitê em relatórios, site institucional e junto às demonstrações financeiras.
- Manutenção de Estrutura e Condições de Funcionamento: Assegure que o comitê tenha acesso a informações, auditores, especialistas e meios necessários para exercer suas funções com independência e efetividade.
Observação:
A extinção do comitê só é permitida com prévia autorização do Bacen e caso a cooperativa deixe de atender aos critérios de obrigatoriedade.
6. Quais os requisitos para compor o Comitê de Auditoria?
Independência, competências e vedações
A Resolução 4.910/21 estabelece critérios rigorosos para garantir a idoneidade, independência e competência do comitê:
- Mínimo de 3 integrantes, definidos no estatuto.
- Independência: Não pode ser, nem ter sido nos últimos 12 meses, diretor, funcionário, auditor, conselheiro fiscal ou responsável técnico pela auditoria da instituição, suas coligadas ou controladas.
- Remuneração restrita: Receber apenas remuneração relativa à função no comitê (salvo acúmulo de cargos, quando deverá optar).
- Vedação de parentesco: Não pode ser cônjuge, companheiro ou parente até segundo grau de pessoa vedada acima.
- Qualificação técnica: Pelo menos 1 membro com formação/experiência contábil comprovada.
- Diretores: Só permitido em comitês de cooperativas não abertas e desde que sejam minoria.
- Mandato: Até 5 anos, renovável – mas para até 1/3 dos membros, o limite é de 10 anos consecutivos.
Essas restrições visam garantir imparcialidade e capacidade técnica, minimizando conflitos de interesse e promovendo decisões alinhadas à integridade organizacional.
7. Quais as principais atribuições do Comitê de Auditoria em cooperativas?
O comitê de auditoria tem papel amplo e decisivo. Suas atribuições, de acordo com a Resolução 4.910/21, incluem:
- Estabelecer normas internas e submeter ao conselho para aprovação;
- Recomendar contratação, remuneração e substituição do auditor independente;
- Revisar, antes da publicação, as demonstrações financeiras e relatórios dos auditores;
- Avaliar a efetividade das auditorias interna e externa, monitorando o cumprimento de recomendações;
- Zelar pela independência do auditor externo;
- Definir e divulgar canais de denúncia para situações de descumprimento de normas internas e externas;
- Elaborar relatórios semestrais detalhando suas atividades, avaliações, recomendações e eventuais divergências com a administração;
- Comunicar ao Bacen, em até 3 dias úteis, a ocorrência de fraudes relevantes, erros materiais ou fatos que comprometam a continuidade da instituição;
- Reunir-se, no mínimo, trimestralmente com diretoria, auditores e conselhos, além de manter atas e relatórios disponíveis para fiscalização.
Essas funções ampliam o controle sobre a integridade dos processos, fortalecendo a confiança no sistema cooperativo.
8. Boas práticas: Como tornar o Comitê de Auditoria um diferencial de excelência?
Além das exigências legais, adotar boas práticas de governança faz toda a diferença para o sucesso do comitê de auditoria e para a imagem da cooperativa.
- Diversidade de perfis e experiências: Evita pensamento de grupo e amplia a visão estratégica.
- Cultura de confiança e ética: Ambiente aberto para dúvidas e debates construtivos.
- Planejamento de reuniões eficaz: Pautas claras, agendas bem preparadas, material objetivo e disponibilizado com antecedência.
- Treinamento e desenvolvimento contínuo: Capacitação frequente para atualização sobre riscos emergentes, mudanças regulatórias, TI, ESG e melhores práticas.
- Comunicação constante: Interação com conselho, diretoria, auditorias e demais órgãos de controle, garantindo alinhamento e resposta rápida a riscos e oportunidades.
- Gestão integrada de riscos: Avaliação contínua de riscos financeiros, operacionais, tecnológicos e socioambientais.
- Transparência com stakeholders: Divulgação clara das atividades, relatórios e mecanismos de denúncia.
Exemplo prático: Uma cooperativa que adota essas práticas tende a reduzir incidentes de fraude, melhorar a eficiência dos controles internos e conquistar maior confiança do mercado, facilitando o acesso a recursos, parcerias e expansão.
9. Conclusão: O Comitê de Auditoria como pilar da governança cooperativa
A implantação do comitê de auditoria em cooperativas de crédito, conforme a Resolução 4.910/21, representa mais do que um cumprimento legal: é um salto de qualidade na gestão, na transparência e na sustentabilidade das cooperativas. Um comitê bem estruturado, diversificado e atuante se torna verdadeiro guardião da integridade, da ética e da perenidade da instituição.
Ao unir rigor normativo, profissionalismo e as melhores práticas internacionais de governança, as cooperativas fortalecem sua posição no sistema financeiro e ampliam o valor entregue aos associados e à sociedade.