Essa diversidade trouxe ganhos significativos, como maior inclusão financeira, tarifas mais competitivas e acesso ampliado a crédito e investimentos. As cooperativas, por exemplo, ocupam espaços abandonados pelos bancos em cidades menores e reinvestem os recursos no desenvolvimento local. As fintechs, por sua vez, revolucionaram a forma como as pessoas interagem com o dinheiro, impulsionadas pelo PIX, pelo open finance e por modelos de negócio centrados no cliente digital.
No entanto, essas inovações também escancaram vulnerabilidades. A velocidade do crescimento das fintechs, nem sempre acompanhada por uma regulação robusta e por estruturas sólidas de governança, abriu brechas exploradas por grupos criminosos. O caso da BKBank, revelado em agosto de 2025 pela Operação Carbono Oculto, tornou-se um marco nesse debate: a fintech foi acusada de movimentar bilhões de reais para organizações criminosas, atuando como um verdadeiro “banco paralelo do crime”.
O episódio não apenas expôs fragilidades do arcabouço regulatório, como também colocou em xeque a confiança do público nas instituições financeiras digitais. Ele reforçou a importância da cooperação entre órgãos como Banco Central, Receita Federal, COAF e CVM, além de inspirar medidas imediatas como a publicação da Instrução Normativa RFB nº 2.278/2025, que ampliou as exigências de monitoramento e transparência sobre fintechs e demais instituições financeiras.
Diante desse cenário, este artigo analisa a evolução do sistema financeiro brasileiro, a regulação aplicada a bancos, cooperativas e fintechs, e os impactos do caso BKBank para o presente e o futuro do setor. Mais do que um episódio isolado, trata-se de um alerta sobre a necessidade de equilibrar inovação e segurança, para que o sistema financeiro siga sendo um pilar de confiança, desenvolvimento e prosperidade para a sociedade.
Evolução do Sistema Financeiro
Bancos Tradicionais
Durante décadas, os bancos dominaram o mercado, mas desde os anos 2010 enfrentam perda de relevância em municípios menores devido ao fechamento de agências e à migração para o digital. Mesmo assim, os quatro grandes bancos ainda concentram parcela majoritária do crédito, embora pressionados por cooperativas e fintechs.
Cooperativas de Crédito
Com mais de 120 anos de história no Brasil, as cooperativas consolidaram-se como alternativa sólida. Em 2024 havia cerca de 750 cooperativas de crédito no país, com atuação em mais de 3.200 municípios, sendo a única instituição financeira em cerca de 470 deles. Atendem a 23 milhões de cooperados, com ativos de R$ 885 bilhões em dezembro de 2024 e projeção de alcançar R$ 1 trilhão até o final de 2025. Diferenciam-se pelo atendimento próximo, reinvestimento local e participação democrática dos associados.
Fintechs
O Brasil concentra quase 60% das fintechs da América Latina, com 2.048 empresas ativas em 2025 — 77% acima de 2020. São protagonistas na inclusão de milhões de clientes desbancarizados e na difusão de meios de pagamento digitais, crédito peer-to-peer, insurtechs e soluções baseadas em open finance. A rápida expansão, contudo, expõe vulnerabilidades quando faltam governança e compliance efetivos.
Diferenças Regulatórias e Supervisão
Os bancos tradicionais seguem a Lei 4.595/1964, com regulação contínua do Banco Central (BCB) e do Conselho Monetário Nacional (CMN). Devem cumprir exigências de capital, limites prudenciais de Basileia e regras de conduta rígidas.
As cooperativas de crédito são regidas pela Lei Complementar 130/2009, supervisionadas pelo BCB e amparadas pelo FGCoop. Sua governança é democrática, baseada no princípio de “um cooperado, um voto”, e contam com estruturas federativas que ampliam resiliência e conformidade.
As fintechs possuem arcabouço mais fragmentado. Instituições de Pagamento seguem a Lei 12.865/2013; fintechs de crédito direto e peer-to-peer seguem a Resolução 4.656/2018. Muitas atuam em segmentos sem regulação direta, escapando de parte da supervisão, o que pode gerar lacunas exploradas por esquemas criminosos — como demonstrado no caso BKBank.
A Instrução Normativa RFB nº 2.278/2025: Um Marco Regulatório para as Fintechs
Após sucessivos casos de irregularidades envolvendo empresas de pagamento e fundos de investimento, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa nº 2.278, em 28 de agosto de 2025, reforçando mecanismos de combate à sonegação e à lavagem de dinheiro.
A norma determinou que Instituições de Pagamento, fintechs de crédito, bancos e cooperativas informem à Receita Federal operações financeiras relevantes em tempo real ou quase imediato, por meio de relatórios eletrônicos padronizados.
As principais novidades incluem:
- Obrigação de reportar depósitos em espécie acima de R$ 2 mil e transações que destoem do perfil do cliente.
- Criação de sistema integrado entre BCB, COAF e Receita para cruzamento automático de dados e detecção de movimentações atípicas.
- Exigência de programas de compliance e auditoria proporcionais ao porte, com responsabilidade pessoal de administradores em caso de omissão.
- Refinamento de obrigações para fundos de investimento, impondo comunicações à Receita e à CVM sobre indícios de ocultação de beneficiários.
No contexto do BKBank, a IN 2.278 ganhou relevância imediata, pois práticas combatidas pela norma — depósitos em espécie sem origem clara, notas fiscais frias e uso de fundos para lavagem — estavam no centro do esquema criminoso.
Estrutura, Governança e Confiança
Bancos são controlados por acionistas privados ou pelo Estado e buscam maximizar retorno ao capital. Cooperativas são sociedades de pessoas, nas quais cada cooperado tem direito a voto e participa dos resultados financeiros e sociais. Fintechs, em geral, são empresas de capital privado ou de venture capital, com foco em escala e crescimento acelerado.
Em termos de confiança, bancos tradicionais transmitem solidez; cooperativas acumulam credibilidade pela proximidade e pelo amparo do FGCoop, que garante depósitos até R$ 250 mil por CPF, equiparando a proteção à dos bancos; fintechs precisam construir reputação e, muitas vezes, não oferecem cobertura garantidora, apoiando-se na segregação de contas.
O Caso BKBank: Banco Paralelo do Crime
A Operação Carbono Oculto, deflagrada em 28 de agosto de 2025, revelou a utilização da fintech BKBank como núcleo de um esquema bilionário de lavagem de dinheiro ligado ao PCC.
Segundo a Receita Federal, a BKBank movimentou R$ 46 bilhões entre 2020 e 2024 de forma irregular, recebeu mais de 10 mil depósitos em espécie somando R$ 61 milhões e processou notas fiscais frias ligadas ao setor de combustíveis. Em coletiva, a instituição foi classificada como “banco paralelo do crime”. A operação também envolveu postos, distribuidoras e fundos de investimento, e resultou no bloqueio de bens e contas. Gestores não foram localizados.
O episódio reforçou a importância da Instrução Normativa 2.278/2025, que passou a exigir justamente o tipo de monitoramento que poderia ter prevenido parte dessas movimentações.
Riscos ao Consumidor e Recomendações
O caso BKBank ilustra riscos enfrentados por consumidores que utilizam instituições sem cobertura de fundos garantidores. Ao contrário de bancos e cooperativas, cujos depósitos são protegidos por FGC e FGCoop, fintechs podem deixar clientes sem ressarcimento em casos de falência ou fraude.
- Verifique no site do Banco Central se a instituição é autorizada.
- Prefira depósitos em bancos ou cooperativas para valores relevantes.
- Diversifique recursos, usando fintechs para pequenas quantias ou serviços específicos.
- Pesquise histórico e reputação antes de confiar seu dinheiro.
- Invista em educação financeira para entender riscos, limites de cobertura e alternativas.
Tendências Futuras
A tendência é de regulação crescente sobre fintechs, com maior rigor em compliance, capital mínimo e monitoramento de operações. Espera-se que o Banco Central e o CMN ampliem normas inspiradas na IN 2.278/2025, alinhando fintechs às obrigações de bancos e cooperativas.
O setor deve passar por consolidação, com sobrevivência de fintechs maiores ou absorção por bancos tradicionais. Enquanto isso, as cooperativas seguem expandindo e adotando inovações tecnológicas, combinando solidez financeira com impacto social.
A Confiança como importante diferencial
O sistema financeiro brasileiro em 2025 é diverso, moderno e competitivo, mas depende de um elemento fundamental: a confiança pública. O caso BKBank mostrou que a ausência de controles eficazes pode transformar inovação em vulnerabilidade.
A Instrução Normativa 2.278/2025 é um avanço essencial, fortalecendo a cooperação entre Receita Federal, Banco Central, COAF e CVM para evitar que o sistema seja instrumentalizado pelo crime organizado. Nesse cenário, as cooperativas de crédito se destacam como modelo equilibrado: modernas como as fintechs, sólidas como os bancos e sustentadas por um propósito social único. Informação, diversificação e responsabilidade devem nortear cada escolha financeira.
Elaborado pelo Portal do Cooperativismo Financeiro