Governança em cooperativas e o papel estratégico do conselho de administração

Governança em cooperativas e o papel estratégico do conselho de administração

Com o avanço das cooperativas de crédito no mercado financeiro nacional muitos conselhos de administração estão mudando sua forma de atuação.

Este artigo dá algumas dicas de como profissionalizar o conselho de administração em cooperativas de crédito, reforçando a governança e adotar pensamento estratégico contínuo — sem perder de vista o propósito e o desenvolvimento regional.


O crescimento das cooperativas de crédito

Nos últimos anos, as cooperativas de crédito conquistaram espaço inédito no mercado financeiro nacional. Em muitos municípios e até em alguns estados, elas deixaram de ser apenas alternativas aos bancos tradicionais e se transformaram nas principais instituições financeiras da região. Esse avanço acelerado exige uma reflexão profunda: como os conselhos de administração devem atuar diante dessa nova realidade?

Se antes bastava aprovar relatórios e acompanhar resultados, agora o conselho precisa atuar com visão de longo prazo, fortalecer a governança e orientar a gestão para a perenidade. Além disso, vale lembrar: a Organização das Nações Unidas declarou 2025 como o Ano Internacional das Cooperativas, reconhecendo o impacto do cooperativismo no desenvolvimento econômico e social. Portanto, a hora de elevar o nível de profissionalismo do conselho é agora.

Mandato do conselho: resultado financeiro + desenvolvimento regional

Cooperativas equilibram sustentabilidade econômica com desenvolvimento social e regional. Logo, o conselho funciona como guardião do propósito: assegura saúde financeira e, ao mesmo tempo, verifica se as decisões fortalecem a economia local, geram oportunidades e ampliam o bem-estar na sociedade da região onde a cooperativa atua.

Na prática, o conselho deve:

  • Definir diretrizes que conectem orçamento, risco e impacto regional.
  • Priorizar projetos que ampliem inclusão financeira e competitividade do território.
  • Exigir indicadores que mostrem, simultaneamente, performance e impacto.

Governança que inspira confiança e disciplina a execução

A governança traduz princípios em práticas que protegem a cooperativa em ciclos de crescimento. O conselho deve estabelecer regras claras, medir riscos com rigor e comunicar com transparência aos associados.

1) Estruturas essenciais

  • Agenda de conselho orientada para o futuro: reservar tempo adequado para temas estratégicos, não só para resultados do mês. A maior parte da reunião do conselho deve ser focada no futuro, não no passado.
  • Comitês (Riscos, Auditoria, Pessoas/Remuneração, Ética/Integridade): a existência de comitês permite que haja foco, profundidade e cadência nos temas que são de responsabilidade do conselho.
  • Políticas críticas: cabe ao conselho de administração fixar o apetite a riscos, definir políticas de renovação e sucessão, políticas de remuneração (dentre outras) e garantir a integridade dos dados e informações.

2) Supervisão estratégica da diretoria executiva

O conselho deve supervisionar a atuação da diretoria executiva sem interferir nas atividades operacionais. Em voz ativa, ele:

  • Define diretrizes e cobra coerência com o propósito.
  • Questiona premissas, pede cenários e acompanha riscos-chave.
  • Monitora marcos e ajusta rota com base em evidências, não em impressões.

Fronteira saudável: o conselho decide “se” e “por quê”; a diretoria decide “como”.

Estratégia em duas camadas: pensamento contínuo e planejamento por ciclos

Aqui está o ponto-chave. Pensamento estratégico e planejamento estratégico não são a mesma coisa — e cada qual tem dono:

  • Pensamento estratégico (do conselho): é permanente, 24×7. O conselho mantém “a lente do futuro” ligada o tempo todo, antecipando tendências, identificando riscos emergentes e abrindo novas possibilidades para a cooperativa.
  • Planejamento estratégico (da diretoria): ocorre em janelas definidas (por exemplo, a cada 3 anos, com revisões anuais). A diretoria detalha metas, roadmaps, recursos e prazos para executar as diretrizes aprovadas pelo conselho.

1) Como o conselho exercita o pensamento estratégico?

  • Faz perguntas de alto impacto: devemos entrar em novo mercado? Qual forma de crescimento faz sentido aqui? O que pode ameaçar nossa relevância regional?
  • Olha além das “marolinhas”: evita aprisionar a pauta nos problemas do dia e prioriza a perenidade.
  • Exige cenários e opções: crescimento orgânico vs. parcerias; expansão física vs. digital; diversificação vs. foco.

2) Exemplos práticos

  • Expansão a novos mercados: o conselho avalia se faz sentido entrar em uma região adjacente; a diretoria define como executar (formato de agência, canais, parceiros).
  • Conjuntura econômica e política regional: o conselho discute impactos de juros, crédito setorial e premissas de atuação; a diretoria recalibra o plano e a carteira de crédito.
  • Fusões, parcerias e integrações: o conselho decide a tese (por quê, quando, com quem) e define salvaguardas; a diretoria conduz a diligência e a integração cultural/operacional.

Em síntese: o conselho pensa estrategicamente o tempo todo. A diretoria planeja e executa por ciclos, reportando aprendizados para novas decisões.

Cultura: coerência entre valores, liderança e rituais

Sem uma cultura alinhada, a estratégia tende a falhar. O conselho atua como guardião da identidade cooperativista, garantindo que crescimento e tecnologia caminhem com ética, participação e foco no associado.

1) O que o conselho precisa garantir

  • Valores traduzidos em comportamentos observáveis (ex.: transparência, respeito, segurança psicológica).
  • Indicadores de cultura além das pesquisas internas (percepção externa, reputação, aderência a valores).
  • Rituais e símbolos que reforçam o propósito e a visão de longo prazo.

2) Liderança como exemplo

Os dirigentes comunicam valores com cada gesto: como decidem, como tratam pessoas e como reconhecem boas práticas. O conselho observa, dá feedback e exige coerência — inclusive em crises.

Como agregar profissionalismo ao conselho de administração em uma cooperativa de crédito

  • Agenda robusta (trimestral e anual) com espaço protegido para estratégia.
  • Formação e avaliação: educação continuada dos conselheiros e board review anual.
  • Sucessão: pipeline de novos conselheiros e critérios objetivos de seleção.
  • Indicadores e painéis: poucos, relevantes e acionáveis (negócio, risco, cultura e impacto regional).
  • Transparência com associados: relatórios claros sobre decisões e resultados.

Protagonismo responsável e olhar para o futuro

As cooperativas de crédito alcançaram protagonismo regional. Para sustentar esse avanço, o conselho de administração precisa liderar estrategicamente, reforçar a governança e zelar pela cultura, equilibrando resultado e desenvolvimento regional. Assim, a cooperativa preserva sua identidade, expande com segurança e cria valor duradouro para associados e para a sociedade da região.


Elaborado pelo Portal do Cooperativismo Financeiro

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