Princípios do Cooperativismo

História do Cooperativismo Mundial » Os 7 princípios do cooperativismo

Os princípios do cooperativismo são diretrizes que orientam a atuação das cooperativas e colocam em prática os valores que sustentam o movimento. Assim, cada princípio traduz um compromisso com a ética, a solidariedade e a democracia. Além disso, na simbologia cooperativista, eles se associam às cores do arco-íris, adotado historicamente como um emblema universal da cooperação.

Origem em Rochdale

Historicamente, a origem desses princípios remonta ao estatuto da Cooperativa de Consumo de Rochdale, fundada em 1844 na Inglaterra. Na época, esse documento continha sete artigos e inspirou os primeiros princípios do cooperativismo, conhecidos como “regras de ouro”. Em 1885, eles foram assim definidos:

  • Adesão livre
  • Controle democrático: “um homem, um voto”
  • Devolução do excedente ou retorno sobre as compras
  • Juros limitados ao capital
  • Neutralidade política, religiosa e racial
  • Vendas a dinheiro e à vista
  • Fomento do ensino em todos os graus

Evolução e atualidade

Com o passar do tempo, o cooperativismo se expandiu para novos ramos de atividade e precisou adaptar seus princípios à realidade social e econômica. Por isso, a Aliança Cooperativa Internacional (ACI) revisou essas diretrizes em 1937, 1966 e 1995. Atualmente, a última atualização — vigente até hoje — reafirma que toda ação cooperativa, em qualquer parte do mundo, deve seguir sete princípios fundamentais.

1) Adesão Livre e Voluntária

As cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas que desejam utilizar seus serviços e assumir responsabilidades como membros. Elas não praticam qualquer tipo de discriminação de gênero, classe social, raça, posição política ou crença religiosa. Assim, o ingresso acontece por livre vontade e dentro das condições previstas na lei e no estatuto.

Aplicação prática

Na prática, isso significa que qualquer pessoa apta, conforme o estatuto social e a legislação, pode solicitar ingresso. Além disso, a decisão de entrar ou permanecer na cooperativa cabe exclusivamente ao interessado. Ninguém pode ser obrigado a se associar ou continuar como membro.

Esse princípio também vale para o relacionamento entre associado e cooperativa singular e para o vínculo entre cooperativas e suas instâncias superiores — federações, centrais e confederações. Dessa forma, em qualquer nível, a adesão depende unicamente da vontade da pessoa ou entidade considerada apta. Caso não cumpra os requisitos legais e estatutários, ela não terá direito de escolha para ingressar ou permanecer.

Base legal

O Princípio da Adesão Livre e Voluntária está diretamente ligado aos valores da liberdade e da igualdade. Portanto, ele garante que a entrada ou saída de membros ocorra sem imposição.

No Brasil, esse princípio está garantido pelo artigo 5º, incisos XVII e XX, da Constituição Federal; pelos artigos 4º, incisos I e IX, e 29 da Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista); e, no caso das cooperativas financeiras, também pelo artigo 4º da Lei Complementar 130/09.

2) Gestão Democrática

As cooperativas são organizações democráticas, controladas pelos seus próprios membros. Todos participam ativamente na formulação de políticas, na definição de estratégias e na tomada de decisões. Os representantes eleitos, homens ou mulheres, respondem diretamente aos demais associados. Nas cooperativas de primeiro grau, cada membro tem direito a um voto, independentemente do valor de suas quotas ou de sua participação econômica. Nas de grau superior, a estrutura também segue critérios democráticos.

Aplicação prática

Esse princípio determina que a governança cooperativa se baseie na participação responsável de todos os membros. Votar e ser votado, dentro das condições previstas no estatuto, é um direito e também um dever. Além disso, a participação na vida da cooperativa é fundamental para o seu sucesso. Cabe às lideranças criar condições para que esse direito-dever seja exercido de forma plena, com canais de comunicação eficientes, acesso transparente às informações e mecanismos que incentivem o engajamento.

O regime democrático funciona com decisões tomadas por maioria — simples ou qualificada, conforme o assunto — e pela representação de todos na assembleia geral, o órgão máximo da sociedade. Nessa estrutura, alguns associados são eleitos para representar o coletivo, assumindo responsabilidades definidas pela lei e pelo estatuto. Em uma cooperativa singular, cada membro tem direito a apenas um voto, com o mesmo peso para todos, independentemente da sua participação financeira.

Base legal

Nas cooperativas de segundo e terceiro graus — como centrais, federações e confederações — é possível o voto múltiplo. No entanto, esse cálculo se baseia no número de associados das cooperativas singulares (no caso das centrais) ou no número de cooperativas de primeiro grau filiadas (no caso das confederações). Qualquer outro critério distorceria o princípio democrático e poderia enfraquecer o sistema cooperativo.

O Princípio da Gestão Democrática dá vida aos valores da democracia, da igualdade, da transparência e da responsabilidade.

No Brasil, ele está previsto nos artigos 4º, incisos V e VI; 38, caput e §3º; 37, inciso III; e 42 da Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista), além do artigo 1.094, incisos V e VI, do Código Civil.

3) Participação Econômica

Os membros contribuem de forma equitativa para o capital de suas cooperativas e participam do controle democrático sobre esse patrimônio. Parte desse capital pertence coletivamente à cooperativa. Quando há condições financeiras, os associados podem receber remuneração sobre o capital integralizado, como previsto no estatuto. Os excedentes gerados são destinados ao desenvolvimento da cooperativa — incluindo a formação de reservas —, à distribuição proporcional aos associados conforme suas operações e ao apoio a atividades aprovadas em assembleia.

Aplicação prática

A cooperativa nasce e cresce com base no capital social e nas reservas construídas ao longo do tempo. Por isso, cada associado contribui para a formação desse patrimônio. Isso ocorre ao integralizar quotas-partes na admissão e durante a permanência e ao aprovar a destinação de parte dos excedentes para reservas. Dessa forma, a cooperativa garante sustentabilidade e capacidade de investir.

Além do aporte de capital, os associados devem utilizar ativamente os produtos e serviços da cooperativa. Afinal, são os proprietários do empreendimento. Esse comprometimento fortalece o negócio e distribui de forma justa o esforço coletivo. Por exemplo, é incoerente que um agricultor associado a uma cooperativa agropecuária entregue sua produção a uma empresa convencional. O mesmo vale para o membro de uma cooperativa de crédito que mantém suas economias em um banco comercial.

Benefícios e base legal

A participação econômica traz recompensas diretas. No dia a dia, os associados se beneficiam de preços e condições mais justas. No fechamento do exercício, recebem a distribuição de resultados proporcional às operações realizadas, além da remuneração sobre o capital integralizado. Parte dos excedentes pode ser direcionada para reservas, que protegem a cooperativa em períodos de crise e financiam investimentos, programas de capacitação e ações comunitárias.

O Princípio da Participação Econômica reforça os valores da responsabilidade e da solidariedade.

Na legislação brasileira, ele está previsto nos artigos 3º e 4º, incisos VII e VIII, da Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista), e no artigo 1.094, incisos VII e VIII, do Código Civil.

4) Autonomia e Independência

As cooperativas são organizações autônomas, formadas por pessoas que se unem para atender necessidades comuns por meio da ajuda mútua. O controle é exercido diretamente pelos associados. Se firmarem acordos com outras organizações, incluindo instituições públicas, ou receberem capital externo, devem fazê-lo em condições que preservem o controle democrático pelos membros e garantam a autonomia da cooperativa.

Aplicação prática

O empreendimento cooperativo nasce e se mantém a partir da iniciativa dos próprios associados, moldando-se pela autogestão. O sucesso ou o insucesso afeta unicamente os membros, que tomam as decisões e assumem os resultados. Por isso, a gestão não pode sofrer interferência externa que comprometa a coletividade. É essencial blindar a cooperativa contra influências políticas ou de qualquer grupo externo que distorça seus objetivos.

Negociações e parcerias com entidades ou órgãos externos devem respeitar limites claros. Elas não podem reduzir o controle democrático, gerar prejuízo aos associados nem criar privilégios para dirigentes ou executivos. Consequentemente, a autonomia preserva a confiança dos membros e a coerência dos valores cooperativistas.

Base legal

O Princípio da Autonomia e Independência está ligado diretamente aos valores da democracia, da transparência e da honestidade.

No Brasil, encontra respaldo no artigo 5º, incisos XVII e XVIII, da Constituição Federal, que assegura que a criação e o funcionamento das cooperativas independem de autorização e proíbe a interferência estatal. A Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista), em seu artigo 4º, inciso IX, reforça esse direito.

Vale destacar que a proibição de ingerência do Estado não elimina o papel de órgãos reguladores e supervisores, como o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central do Brasil, no caso das cooperativas de crédito. Essas entidades atuam para garantir o cumprimento da legislação e proteger os interesses dos cooperados, sempre respeitando os princípios do cooperativismo.

5) Educação, Formação e Informação

As cooperativas investem na educação e na formação de seus membros, dirigentes e colaboradores, para que possam contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento da organização. Elas também promovem a disseminação de informações ao público em geral — especialmente jovens e formadores de opinião — sobre a natureza, os benefícios e a importância da cooperação.

Aplicação prática

Aplicar este princípio significa preparar as pessoas que fazem parte da cooperativa — associados, conselheiros, diretores, colaboradores e prestadores de serviços — para compreender e praticar os valores e princípios do cooperativismo no dia a dia. Quanto mais capacitado for o quadro social, mais sólida e sustentável será a cooperativa.

O desconhecimento sobre o funcionamento e os objetivos de uma cooperativa aumenta o risco de descompromisso, especialmente em períodos de dificuldades econômicas. Por isso, programas de formação devem considerar o perfil de cada público interno. No caso dos associados, assumir um cargo eletivo deve vir acompanhado de um processo estruturado de capacitação sobre o universo cooperativo.

O ensino do cooperativismo desde o nível escolar é estratégico para ampliar sua presença na sociedade. Embora existam iniciativas bem estruturadas, ainda é necessário ampliar o alcance, principalmente entre estudantes e acadêmicos de economia, administração e direito.

Comunicação e base legal

Além de preparar o público interno, as cooperativas precisam informar e sensibilizar a comunidade. Eventos, feiras, fóruns, templos religiosos e mídias — inclusive de massa — são canais valiosos para compartilhar a filosofia e os resultados da cooperação. Uma comunicação integrada, em nível nacional e segmentada por ramos, fortalece a adesão de novos associados, especialmente nos grandes centros urbanos.

O Princípio da Educação, Formação e Informação relaciona-se diretamente com os valores da transparência e da responsabilidade.

No Brasil, ele está previsto nos artigos 4º, inciso X, e 28, inciso II, da Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista), na Medida Provisória 1.715/98 (arts. 7º e 9º) e, no caso das cooperativas financeiras, na Lei 11.524/07 (art. 10), que destina 2,5% da folha de pagamento ao Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCOOP) para programas de capacitação.

6) Intercooperação

As cooperativas fortalecem sua atuação e prestam melhores serviços aos associados quando trabalham em conjunto. A intercooperação acontece por meio de parcerias entre cooperativas locais, regionais, nacionais e internacionais, criando redes que aumentam a eficiência e a força do movimento cooperativo.

Formas de integração

Integração horizontal envolve a parceria entre cooperativas de primeiro grau, seja do mesmo ramo ou de ramos diferentes. Por exemplo, o uso de serviços e produtos das cooperativas de crédito por cooperativas de outros setores. Essa prática evita que recursos e operações migrem para empresas convencionais e fortalece o próprio sistema cooperativo.

Integração vertical ocorre quando cooperativas se unem em níveis superiores, como centrais, federações e confederações. Essa estrutura traz ganhos de escala, reduz custos, melhora a padronização de serviços e possibilita investimentos em equipes mais qualificadas e soluções mais inovadoras. Além disso, transmite ao mercado uma imagem de solidez e organização.

Aplicação no ramo financeiro e base legal

No ramo financeiro, a intercooperação entre diferentes sistemas e subsistemas é estratégica. A aproximação entre confederações e bancos cooperativos permite compartilhar infraestrutura, reduzir custos e ampliar o alcance dos serviços, sempre no interesse dos cooperados. Consequentemente, a rede se torna mais eficiente e resiliente.

O Princípio da Intercooperação expressa o valor da solidariedade, pois visa ao fortalecimento de todo o movimento, garantindo que cooperativas de diferentes ramos cresçam e se mantenham saudáveis.

Na lei brasileira, ele está previsto nos artigos 8º (parágrafo único) e 9º da Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista) e, no caso das cooperativas de crédito, no preâmbulo e nos artigos 14 (parágrafo único) e 15 da Lei Complementar 130/09.

7) Interesse pela Comunidade

As cooperativas têm como compromisso contribuir para o desenvolvimento sustentável das comunidades em que atuam. Esse envolvimento se materializa por meio de políticas e ações aprovadas pelos próprios associados, alinhadas às necessidades e potencialidades locais.

Aplicação prática

Cooperativa e comunidade mantêm uma relação de interdependência. De um lado, a cooperativa oferece soluções financeiras, comerciais ou de serviços adaptadas à realidade local. De outro, a comunidade fortalece a cooperativa ao utilizá-la como parceira no desenvolvimento econômico e social. Por isso, não é exagero dizer que uma cooperativa de crédito é a instituição financeira da comunidade.

Respeitar as características sociais, culturais e econômicas da região é fundamental. Isso inclui apoiar projetos humanitários, fomentar atividades produtivas e promover a circulação local dos recursos — algo que as cooperativas financeiras fazem ao reinvestir o dinheiro captado na própria região, gerando novas oportunidades e renda.

Responsabilidade e base legal

O interesse pela comunidade exige responsabilidade social, econômica e ambiental. Cooperativas não têm como objetivo maximizar lucros a qualquer custo; em vez disso, buscam margens justas que permitam reinvestir no negócio e apoiar iniciativas comunitárias. Além disso, cabe aos associados decidir as diretrizes que a administração seguirá para garantir a aplicação consistente do princípio.

O Princípio do Interesse pela Comunidade liga-se diretamente ao valor da responsabilidade socioambiental.

No arcabouço legal, ele encontra respaldo no artigo 192 da Constituição Federal (para cooperativas de crédito), nos artigos 3º e 4º, inciso XI, da Lei 5.764/71 (Lei Cooperativista) e, especificamente no caso das cooperativas de crédito, no artigo 2º, §1º, da Lei Complementar 130/09.

Leitura integrada dos princípios

Os sete princípios do cooperativismo não existem de forma isolada. Em síntese, cada um representa um pilar fundamental; contudo, o verdadeiro potencial do modelo cooperativo surge quando todos são compreendidos e aplicados em conjunto. Dessa forma, eles formam um sistema integrado de valores e práticas que orienta a gestão, fortalece a participação dos associados e assegura que as cooperativas cumpram sua função social e econômica.

Como se reforçam mutuamente

A adesão livre e voluntária garante que cada membro esteja na cooperativa por escolha consciente, preservando a liberdade individual. Em seguida, a gestão democrática assegura que essa liberdade se traduza em participação efetiva nas decisões. Ao mesmo tempo, a participação econômica conecta direitos e deveres, mostrando que a sustentabilidade depende do engajamento financeiro e operacional de todos.

Paralelamente, a autonomia e independência preserva a essência da cooperativa frente a influências externas, enquanto a educação, formação e informação fornece as ferramentas para que associados e comunidade compreendam e defendam o modelo. Além disso, a intercooperação amplia a força do movimento, unindo esforços entre ramos e regiões. Por fim, o interesse pela comunidade coloca em prática o propósito maior: gerar desenvolvimento, inclusão e bem-estar onde a cooperativa está inserida.

Bússola estratégica para decidir e agir

Lidos de forma integrada, esses princípios formam uma verdadeira bússola estratégica para o cooperativismo. Assim, eles orientam desde a relação interna entre associados até a interação com o mercado e a comunidade. Quando aplicados com coerência e de maneira simultânea, garantem que a cooperativa não seja apenas uma alternativa econômica, mas um instrumento de transformação social, capaz de equilibrar eficiência, justiça e solidariedade.

Em conclusão, mais do que um conjunto de regras, os princípios do cooperativismo são um compromisso vivo, que deve guiar decisões, inspirar ações e fortalecer o elo entre pessoas que acreditam que a união é o caminho para construir um futuro mais próspero e equilibrado.


Elaborado pelo Portal do Cooperativismo Financeiro

18 Comentários

  1. Obrigado sor Gustavo pelo trabalho de copiar os 7 princípios

  2. É uma matéria muito boa que faz as cooperativa e faz mudar consciência de qualquer um para um espírito cooperativismo

  3. Sou admirador do entusiasmo e fidelidade ao propósito que o Ênio sempre nos demonstra. Acompanhar a transformação digital, mantendo a filosofia e o foco no sucesso do cooperado, é muito desafiador. Mas, não acredito que haja modelo de instituição financeira mais justo e capaz que o Cooperativismo. Parabéns e obrigado!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *