Legislação Cooperativista

Legislação Cooperativista

O cooperativismo de crédito no Brasil é fruto de uma longa trajetória marcada por avanços, retrocessos e transformações profundas. Sua evolução legislativa reflete os diferentes momentos políticos e econômicos do país, desde o início do século XX até os dias atuais.

Este artigo apresenta uma linha do tempo dos principais marcos legais que moldaram o setor, com destaque para os períodos pré-regime militar, regime militar e pós-Constituição de 1988.

As Origens Legislativas (1903–1964)

O cooperativismo brasileiro começou a ganhar forma com o Decreto nº 979 de 1903, que permitia a criação de cooperativas ligadas a sindicatos rurais. Embora incipiente, essa legislação abriu caminho para a organização econômica coletiva no campo.

Em 1907, o Decreto nº 1.637 trouxe definições mais claras sobre as cooperativas, estabelecendo princípios como:

  • Capital social variável;
  • Número ilimitado de sócios;
  • Incessibilidade das quotas a terceiros;
  • Distribuição proporcional das sobras;
  • Isenção de tributos para operações de pequeno valor.

Durante a Era Vargas, o cooperativismo ganhou impulso com o Decreto nº 22.239 de 1932, considerado a primeira Lei Geral do Cooperativismo. Ele reconheceu diferentes modelos de cooperativas, como Raiffeisen, Luzzatti e Desjardins, e estabeleceu bases para sua atuação no meio rural e urbano.

Em 1951, a criação do Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC) pela Lei nº 1.412 buscou apoiar financeiramente as cooperativas, embora sem se tornar um órgão de cúpula do sistema.

O Regime Militar e a Restrição (1964–1980)

Com a promulgação da Lei nº 4.595/64 – Lei da Reforma Bancária, as cooperativas de crédito passaram a ser equiparadas às instituições financeiras e submetidas à regulação do Banco Central. Essa mudança representou um período de forte retração para o setor.

As principais funções das cooperativas foram atribuídas às instituições financeiras estaduais, e diversas restrições operacionais foram impostas:

  • Limitação das taxas de juros;
  • Proibição de captar depósitos a prazo;
  • Obrigatoriedade de direcionar 80% da carteira ao crédito rural.

Essas medidas, somadas à suspensão da criação de novas cooperativas pelo Decreto nº 1.503/62, resultaram em uma redução drástica do número de cooperativas de crédito no país.

Reestruturação Legal e Fortalecimento (1971)

Em 1971, foi promulgada a Lei nº 5.764/71 – Lei do Cooperativismo Brasileiro, que instituiu a Política Nacional de Cooperativismo e o regime jurídico das sociedades cooperativas. Ela definiu princípios fundamentais como:

  • Adesão voluntária;
  • Capital social variável;
  • Retorno das sobras proporcional às operações;
  • Natureza civil e não sujeita à falência;
  • Neutralidade política e social.

Essa lei permanece como base estrutural do cooperativismo brasileiro, sendo complementada por legislações específicas para o setor de crédito.

A Redemocratização e o Reerguimento (1988–2009)

A Constituição Federal de 1988 representou um divisor de águas para o cooperativismo de crédito. Diversos dispositivos passaram a garantir autonomia e reconhecimento às cooperativas:

  • Art. 5º, Inciso XVIII: A criação de cooperativas independe de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.
  • Art. 146, Inciso III, alínea “c”: Estabelece o adequado tratamento tributário ao ato cooperativo.
  • Art. 174, §2º: A lei apoiará e estimulará o cooperativismo.
  • Art. 192: Reconhece as cooperativas de crédito como parte integrante do Sistema Financeiro Nacional.

Consolidação Legal e Modernização (2009–Presente)

A promulgação da Lei Complementar nº 130/2009 – Lei do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo foi um marco definitivo para o setor. Ela regulamentou de forma específica o funcionamento das cooperativas de crédito, conferindo-lhes segurança jurídica e autonomia operacional.

Mais recentemente, a Lei Complementar nº 196/2022 – Atualização da LC 130/2009: trouxe importantes inovações:

  • Reconhecimento das confederações de serviço como integrantes do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo;
  • Ampliação da área de atuação das cooperativas singulares;
  • Permissão para operações de crédito compartilhadas entre cooperativas do mesmo sistema;
  • Regras mais claras sobre governança, quadro social e prestação de serviços a não associados;
  • Fortalecimento da atuação das cooperativas junto ao setor público e fundos garantidores.

A história do cooperativismo de crédito no Brasil é marcada por resiliência e adaptação. De uma legislação incipiente no início do século XX, passando por períodos de forte repressão durante o regime militar, até alcançar reconhecimento constitucional e regulamentação moderna, o setor se consolidou como um pilar do sistema financeiro nacional.

Hoje, as cooperativas de crédito desempenham papel fundamental na inclusão financeira, no desenvolvimento regional e na promoção de uma economia mais justa e colaborativa. Conhecer essa trajetória é essencial para compreender seu valor estratégico e seu potencial transformador.

2 Comentários

  1. É normal o banco Sicredi pedir valor real e mais avalista para o custeio rural?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *