“O homem superior atribui a culpa a si próprio; o homem comum, aos outros.” (Confúcio).
O ambiente profissional – ainda bem – revela mais soluções do que problemas; menos conflitos do que entendimentos; menos indiferenças do que manifestações de solidariedade; menos enfermidades do que boas condições de saúde.
Mas há uma adversidade que insiste em permear as organizações. Falo de uma doença grave, que se alastra de forma avassaladora, elevando-se, por sua dimensão e efeitos, ao grau de pandemia. A “síndrome da não culpa”: eis o mal a que me refiro!
E como se revela o sintoma desse “distúrbio”? A constatação não requer nenhum diagnóstico mais aprofundado. Basta que se apresente um problema – operacional, legal, administrativo ou de outra ordem -, ou ainda apareça uma dificuldade qualquer, e o doente-portador, devidamente “armado”, sai imediatamente na defensiva: “a culpa não é minha/nossa”, “não tenho/temos nada a ver com isso”, “o responsável é o fulano ou a área tais”, “não posso fazer nada”, e por aí vai.
Num estágio ainda mais avançado da moléstia, há os que já tratam de arranjar justificativas ou evasivas antes mesmo de o problema concretizar-se! E o pior é que isso pode sair do mundo da ficção e virar realidade… A propósito desse grupo de enfermos o escritor John Maxwell apresenta uma esclarecedora impressão. Diz ele: “as pessoas desperdiçam energia fantasiando soluções para problemas que temem aparecer em seu caminho. Ironicamente, o que começou como um medo infundado pode se transformar em um problema real, porque a pessoa desperdiçou energia pensando em coisas que gostaria que fossem realidade, em vez de pensar em uma ação eficaz” (in 6 John Maxwell John C, Você faz a diferença: como sua atitude pode revolucionar sua vida / John C. Maxwell; tradução de Valéria Lamim Delgado Fernandes. São Paulo: T. Nelson, 2006).
Assumir os próprios erros ou a responsabilidade pela sua ocorrência enquanto gestor são atitudes dignas e corajosas, virtude infelizmente ausente em muitas pessoas. Quando os problemas aparecem, o normal é o executivo (e os colaboradores que nele se espelham) eximir-se da responsabilidade e procurar “bodes expiatórios”, iniciando-se, assim, o conhecido “jogo de culpa” ou “jogo de empurra”. Em vez da busca da solução, dando curso à verdade, o foco passa a ser a identificação de subterfúgios para a autopreservação, muitas vezes transferindo ou tentando empurrar a reponsabilidade para um terceiro, não raro colega de profissão.
O personagem bíblico Adão talvez tenha sido o primeiro a padecer dessa doença. Quando Deus lhe perguntou se o havia desobedecido, ele respondeu: “Foi a mulher que me deste por companheira que me deu o fruto da árvore, e eu comi” (Gênesis, Capítulo 3, Versículo 12 – Bíblia Sagrada). As consequências para ele próprio e para a humanidade todos conhecemos…
Observador atento e combatente desse comportamento, o líder cooperativista José Salvino de Menezes, muito acertadamente, costuma dizer: “depois que inventaram a desculpa, ninguém mais comete erros”.
E que implicações essa postura provoca, mais especificamente na seara profissional? Muitas! A principal delas é a não resolução do problema ou não equacionamento da demanda, em flagrante desrespeito àquele que está “do outro lado” aguardando providências (que não quer saber de quem é a culpa…!). Outra consequência é a desarmonia que a (falta de) atitude ocasiona nas organizações ou entre organizações, já que se instala um ambiente de “queda de braços”, de desconfiança e de desesperança. Um terceiro efeito é o aumento de custos nas empresas, já que na falta ou no retardamento da solução, a saída é incrementar estruturas ou fazer investimentos adicionais – em outras áreas ou entidades – para resolver os problemas. Aliás, o tempo que se perde discutindo de quem é a culpa ou mesmo para tentar justificar o injustificável, é por si só um fator de improdutividade, implicando dispêndios sem necessidade.
A postura esperada dos verdadeiros profissionais, ainda que determinada adversidade não lhes possa ser atribuída imediatamente, é agir (“matar no peito”) em sua área de domínio/responsabilidade ou promover articulações em sua área de influência, mobilizando pessoas e recursos para dar conta do “recado”. Além de tudo, este gesto é uma demonstração de respeito.
Em relação aos líderes e principais executivos, por servirem de referência aos demais, essa iniciativa é ainda mais aguardada. Poder e responsabilidade estão íntima e proporcionalmente atrelados.
Não se deve ter receio de admitir falhas ou avocar responsabilidade, especialmente quando se é gestor, pois falíveis todos são – pela simples condição, primária, de seres humanos. Aliás, é também meritório aprender com o erro, pois só assim evita-se a reincidência em circunstâncias semelhantes. Atribuir a responsabilidade a outrem ou tentar justificar demasiadamente os erros reduzem o prestígio profissional, às vezes sem que se o perceba. O certo é canalizar as energias para a solução e a verdade, em vez de ficar procurando desculpas e formas de desqualificar terceiros, muitas vezes colegas de profissão.
Como ensina Augusto Cury, “Ser sábio não quer dizer ser perfeito, não falhar, não chorar e nem ter momentos de fragilidade. Ser sábio é aprender a usar cada dor como uma oportunidade para aprender lições, cada erro como uma ocasião para corrigir rotas, cada fracasso como uma chance para ter mais coragem. Nas vitórias, os sábios são amantes da alegria; nas derrotas, são amigos da reflexão” (in 12 semanas para mudar uma vida. Augusto Cury Colina, SP: editora Academia de Inteligência, 2004).
A prática do “mea culpa”, de maneira sincera e construtiva, diferentemente do que alguns podem imaginar, contribui para aumentar o apreço profissional e pessoal, e é indispensável para a evolução nos dois planos. Além disso, o ambiente harmonioso daí resultante, ao mesmo tempo em que repercute na redução de falhas futuras, potencializa a capacidade de entrega das organizações.
Abraham Lincoln já ensinava que “você não consegue escapar da responsabilidade de amanhã esquivando-se dela hoje”. Daí que assumir a culpa, logo cedo, é bem melhor do que alguém descobrir a verdade mais tarde. E isso fatalmente ocorrerá, ainda que a aposta seja em contrário…!
Portanto, deve-se evitar o contágio pela moléstia da irresponsabilidade. Como medidas de prevenção há que se antecipar à imputação; admitir o erro e tratar do problema imediatamente; evitar críticas e desgastes desnecessários; dar o exemplo para os colegas (pares e liderados); … dormir tranquilo. Enfim, agir como sábio!
Este tema, por sinal, pelo seu grau de importância e impactos gerados nas empresas, habilita-se como pauta frequente em treinamentos e diálogos/feedbacks dos líderes organizacionais com/para os seus executivos. Nessas abordagens, como recurso de apoio, sugere-se apresentar o vídeo “O problema não é meu”, distribuído pela Siamar, que retrata, didaticamente e precisamente, o comportamento dos atores comprometidos (adequado) e descomprometidos (inadequado) diante de um problema concreto.
“Quase todas as nossas falhas são mais perdoáveis do que os métodos que concebemos para escondê-las”
(François Poitou, o Duque La Rochefoucauld)
Enio Meinen é advogado, pós-graduado em Gestão Estratégica de Pessoas e Diretor Operacional do Banco Cooperativo do Brasil – Bancoob.
Enio!
Parabéns, um otimo assunto que muitas vezes falta ser abordado dentro das organiações. Está na hora dos verdadeiros profissionais serem valorizados pelas atitudes que tomam.
Um abraço.
com certeza o problema é esse.
palavra de Kanitz
É puro amadorismo, e estes amadores se dizem gestores e administradores sem corar
Nossa adorei a matéria, é importante tratar os problemas com maturidade. Buscar soluçoes e nao camuflar o problema.